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    Fernando Canzian

    Medo das agências de risco?

    30/07/2015 09h05

    Antes mesmo do provável rebaixamento pelas agências de classificação de riscos, o Brasil é o emergente que mais tem sofrido com a fuga de investidores de seus ativos nas últimas semanas.

    Um dos maiores engodos do capitalismo está prestes a retirar do Brasil o chamado "grau de investimento" e classificá-lo como "investimento especulativo". Com isso, o país perderá o selo de "bom pagador".

    Vistas como bedéis dos mercados financeiros, as chamadas agências de classificação de risco estão normalmente atrasadas e desorientadas. Desta vez não parece diferente.

    Antes da crise global de 2008, essas agências davam notas máximas (AAA) a títulos que, soubemos depois, tinham como lastro até imóveis caindo aos pedaços no Alabama.

    Quando a crise estourou, vimos que elas tinham capacidade muito limitada de avaliar riscos. Principalmente de papéis com "ativos podres" (como casas no Alabama) escondidos atrás de nomes incríveis e cheios de superlativos.

    Embora desacreditadas, as agências ainda funcionam por uma questão de fé depositada por investidores em uma igreja de falsos profetas. Consequência da falta de racionalidade e bússola confiável nos mercados.

    Mesmo assim, perder o selo de "bom pagador" significa que fundos que cuidam do dinheiro de aposentados ao redor do mundo, por exemplo, não poderão mais (por contrato) investir em papéis brasileiros.

    Isso desvalorizará nossos ativos (ações, imóveis, moeda). Ficaremos mais pobres e mais distantes da recuperação da crise em que Dilma Rousseff nos meteu.

    No caso brasileiro (com recessão, inflação alta e dívida pública crescente), as agências só seguem uma manada de dinheiro grosso que já começou a atravessar a porteira de saída faz algum tempo.

    O gráfico abaixo mostra como os maiores fundos de investimento do mundo passaram a agir em relação às economias emergentes desde junho.

    No canto direito está o Brasil. É o país que mais sofre com a fuga de investidores (queda de 3,5% do total aplicado). Os dados são do Institute for International Finance (espécie de Febraban global).

    Editoria de Arte/Folhapress

    Na prática, com pouquíssimas exceções (Índia é a maior delas, com crescimento previsto de 7,5% neste ano), quase todos os emergentes estão sofrendo com a fuga de investidores.

    O movimento nem é recente. Vem sendo ensaiado desde os meses finais de 2013, como mostra o gráfico abaixo. Nele, a linha azul indica o fluxo de investimentos para os países ricos. A vermelha, para os emergentes.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Depois de alguma dúvida em meados do ano passado, o mercado aparentemente decidiu, agora com convicção, proteger seu dinheiro grosso em ativos dos países ricos.

    Isso ocorre porque as economias avançadas de EUA e Europa finalmente parecem sair com mais força do atoleiro em que se meteram desde 2008. Com isso, vão crescer mais, comparativamente aos emergentes, oferecendo mais chances de ganhos futuros.

    Pelas projeções do FMI, o crescimento nos dois lados do Atlântico Norte será consistente em 2015: nos EUA, 3,1% (2,4% no ano passado); na Europa rica, 1,7% (1,3%). Até a Espanha, que vinha patinando mais do que a média nos últimos anos, tem alta do PIB projetada em 2,5% neste ano (1,4% em 2014).

    Entre os emergentes, sofrerá mais quem crescer menos. Para saber disso, não precisamos sequer de agências desacreditadas.

    fernando canzian

    É repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de política, do "Painel" e correspondente da Folha em NY e Washington. Vencedor de quatro prêmios Esso.

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