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    Fernando Canzian

    Renda e desigualdade retomam filme de terror

    24/03/2016 08h23

    Chegou ao fim o que de melhor aconteceu no Brasil nos últimos muitos anos.

    O ciclo de mais de uma década de diminuição da desigualdade social e melhora na renda dos brasileiros foi interrompido. Em seu lugar, entra algo inédito: a combinação de queda nos rendimentos com piora na equidade.

    Duas forças conspiram contra esses índices, que definem muito do bem-estar da população.

    De um lado, o desemprego avança rapidamente (foi a 8,2% em fevereiro nas regiões metropolitanas) e a renda cai (despencou 7,5% em 12 meses, já descontada a inflação).

    De outro, o descontrole das contas do governo (a previsão de déficit é de quase R$ 100 bi neste ano) impossibilitará o reforço de programas sociais. Como reajustes para a Previdência acima da inflação ou mesmo do Bolsa Família, que já não foi corrigido em 2015.

    Ao longo de 13 anos do PT no governo, os mais pobres foram muito beneficiados por programas sociais. Na média, no entanto, 80% da melhora na distribuição de renda veio do trabalho.

    Foi o esforço dos brasileiros dentro de um ambiente econômico muitas vezes hostil que predominou para a redução da desigualdade.

    No período até 2014, todos ganharam. A renda dos 10% mais pobres aumentou 130% além da inflação. No decil mais rico, o ganho alcançou 30%. Foi a melhor fase para a distribuição de renda da história brasileira.

    Isso agora fica para trás ao mesmo tempo em outros elementos importantes desajustam o país e o mercado de trabalho, motor da melhora na equidade.

    O PIB de 2015 revelou queda de -6,2% na atividade industrial, a que concentra os melhores e mais bem pagos empregos. Já os investimentos caíram -14,1%, o que significa que o país não está renovando máquinas, estradas e infraestrutura em geral, comprometendo nossa produtividade futura e a melhora na renda.

    O economista Marcelo Neri, diretor do FGV Social, da FGV-Rio, diz que até 2014 os brasileiros conseguiram atuar como uma espécie de "Indiana Jones", saltando de empregos formais perdidos para bicos ou para o trabalho por conta própria, a fim de manter a renda em alta e a desigualdade em baixa.

    No final, a partir de 2015, as políticas equivocadas dos últimos anos sob Dilma, os embates no Congresso e a crise de confiança geral acabaram criando um ambiente que nem um herói de cinema foi capaz de superar.

    *

    O quadro abaixo mostra como evoluíram a renda dos brasileiros (trabalho, Previdência, etc.) e a equidade social entre 1999 e 2015, ano em que os dois indicadores caíram juntos pela primeira vez desde o início da série da chamada Nova Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) do IBGE, em 1992.

    Note-se que nem nas grandes crises de 1999 e 2003, quando o chamado "índice de bem-estar" (combinação entre renda e equidade) caiu, houve uma tendência negativa para os dois indicadores (juntos) como agora.

    Editoria de Arte/Folhapress
    fernando canzian

    É repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de política, do "Painel" e correspondente da Folha em NY e Washington. Vencedor de quatro prêmios Esso.

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