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    Francisco Daudt

    Predação, guerra e tirania

    24/06/2015 02h00

    A predação, a guerra e a tirania sempre foram vantagem reprodutiva para seus executores, dando-lhes maior acesso ao sexo, que é nossa mais primitiva e poderosa motivação na vida.

    Os predadores, os ladrões, os corruptos visam a riqueza fácil, e ostentar riqueza equivale, na seleção sexual, às penas do pavão: atrai muitas pavoas. A guerra é a maior facilitadora do estupro coletivo, e o estupro é uma das estratégias reprodutivas de nossa espécie, infelizmente. Além disso, a guerra aumenta o poder de quem vence, e ter poder, já dizia Henry Kissinger, é o maior afrodisíaco que existe.

    O mesmo pode ser dito da tirania –o poder absoluto não só é atraente como corrompe absolutamente, um somatório de vantagens reprodutivas. Ao ponto de Tirano, na origem, ser um título de governante, e não um xingamento, que essa coisa de democracia é muito recente na história de nossa espécie (só 2.400 anos).

    Destarte, motivação para o mal é o que não nos falta. Mas, como para uma ação humana acontecer são necessários motivação, meios e oportunidades, se queremos o bem, precisamos trabalhar em duas frentes: premiar o bem e reduzir os meios e as oportunidades para o mal.

    O maior prêmio do bem pode ser a consciência tranquila e seu bom nome preservado, mas o bem sempre deveria dar lucro para que fosse ainda mais atraente fazê-lo: chama-se a isso "meritocracia".

    Freud disse muito sabiamente que, "se a virtude não for premiada nesta Terra, a ética pregará em vão". A premiação do fazer o bem, da ética ativa, está em sintonia com a ética de John Stuart Mill: quero que todos sejam felizes, pois suas infelicidades perturbam a minha felicidade. Nunca vi ética mais sintônica com nossa natureza egoísta que esta.

    Quando o mal é punido, as oportunidades e os meios de fazê-lo escasseiam. Eis porque é tão bem-vinda uma justiça Erga Omnes, em que todos são iguais perante a lei e em que ela alcance os mais poderosos.

    A guerra deve ser prevenida levando em conta o ânimo belicoso da natureza humana: "Si vis pacem para bellum", diziam os romanos: "Se queres a paz, prepara a guerra". Por favor, não fique contando com campanhas educativas e atitudes eternamente complacentes com os agressores, não lhes passe a mão no Cabello, não espere caírem de Maduro. Lembrem-se da tolerância de Chamberlain com Hitler...

    Sim, tirano é tirano, e a vontade de tirania não adormece nunca, daí que "o preço da liberdade é a eterna vigilância". Quando o Supremo reafirma que a liberdade de expressão vale mais que a vontade do Rei, ele está mandando um recado àqueles que espreitam sem trégua a possibilidade de exercer um "controle da imprensa", ou qualquer outro nome que se dê para a censura prévia aos inconvenientes. É preciso lembrar Millôr: "Imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados".

    É preciso lembrar que não existe casa pronta nem "democracia consolidada": sem manutenção permanente, tanto uma quanto outra entram em decadência. A ruína e a tirania são seus destinos entrópicos.

    É hora de içar as velas de nossos valores: ventos de dignidade começam a soprar no país!

    francisco daudt

    Escreveu até dezembro de 2017

    Psicanalista e médico, é autor de 'Onde Foi Que Eu Acertei?', entre outros livros.

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