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    Francisco Daudt

    No meu sonho, escola focaria cidadania e economia doméstica

    25/10/2017 02h00

    Sérgio Bernardes, o arquiteto, respondia àqueles que reclamavam de seus projetos amalucados: "Eu sei que eles não vão ser realizados mesmo, deixa eu delirar".

    Pois é motivado por ver meu filho estudando como nunca ("Ah, agora que a escolaridade acabou, eu posso estudar o que quero"), e por mais um massacre feito por aluno vítima de bullying, que me valho da licença de Bernardes para delirar meu sonho de escola.

    Nela, seus ensinos principais seriam cidadania e economia doméstica, com matérias subordinadas a esses aprendizados.

    Sob o poder moderador da direção da escola, os alunos brincariam de aprender sobre democracia: a principal função do Estado (segurança pública com implementação das leis); a razão de haver Três Poderes separados (permanente desconfiança de vocações tirânicas, cada um vigiando o outro); respeito ao contraditório; as vantagens do Parlamento; a mediação de conflitos através do Judiciário (fim do bullying impune ou da vingança pelas próprias mãos); a busca das igualdades ambicionadas pela democracia (de oportunidades e perante às leis); aprenderiam que o voto é a última instância decisória e só acontece depois de muito debate; liberdade de pensamento e de expressão (respeitadas as proibições de injúrias, calúnias e difamações); liberdades em geral, se respeitadas as leis; a função dos impostos e sua necessária ligação com os deveres do serviço público ("No taxation without representation").

    A lista é interminável, o que está aqui apenas abre o debate. Poderiam brincar de formar um parlamento, um Executivo e um Judiciário, experimentar a democracia representativa.

    No aprendizado de economia doméstica, a primeira lição seria: dinheiro não cai do céu (Milton Friedman, "não existe essa coisa de almoço grátis"). "Quais são meus custos; quais são meus ganhos"; diferença entre custo fixo e custo variável; entre gasto e investimento; relações custo/ benefício; poupança ligada a planejamento de médio e longo prazo; diferenças entre regimes econômicos (capitalismo/ socialismo); relação entre regimes econômicos e regimes de governo.

    Como se daria a transmissão de conteúdos? Aí vem uma parte que é o meu xodó: a santa tecnologia iria realizar uma aproximação do mais caro ideal da democracia, a igualdade de oportunidades. Por meio de tablets e de tutoriais, os alunos de Quixeramobim teriam também os melhores professores do país. A história e a geografia servindo ao aprendizado de cidadania; a matemática e a física, ao de economia doméstica (quem quisesse ir além dos juros e da regra de três, iria fazê-lo por interesse próprio, não por imposição); a língua portuguesa aprendida durante as respostas discursivas aos testes (haveria testes ao fim de cada aula no tablet, tanto discursivas quanto de múltipla escolha), num revisor de texto que mostrasse as impropriedades da escrita.

    Haveria grupos de estudos eletivos e obrigatórios, com monitores para ajudar, mas sobretudo para ensinar a estudar.

    Finalmente, o recreio: aprendizado de ética na convivência e no esporte.

    Algo precisa mudar: a escola atual não prepara cidadãos éticos e independentes.

    Zé Carlos Barretta - 4.set.2013/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 04-09-2013, 12h00: As criancas (da esquerda para direita) Mariana Mello, 11, Maria Fernanda Ortiz, 10 e Bianca Iederfeind, 10 alunas da escola Oswald de Andrade na Vila Madalena leem a Folhinha no tablet e falam sobre sua relacao com o caderno infantil. (Foto: Ze Carlos Barretta/Folhapress FOLHINHA)
    Estudantes de colégio de São Paulo leem usando tablet

    francisco daudt

    Escreveu até dezembro de 2017

    Psicanalista e médico, é autor de 'Onde Foi Que Eu Acertei?', entre outros livros.

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