SÃO PAULO - O armênio Tigran Petrossian (1929-1984), talvez o maior gênio tático da história do xadrez, era chamado por adversários de "Grande Embusteiro" pela habilidade de ludibriá-los a olhar para um canto do tabuleiro, desviando a atenção sobre peças secundárias que, logo, viriam a ser decisivas.

Os grampos de Lula e sua divulgação juridicamente questionável desviaram a atenção da plateia do avanço silencioso da Lava Jato rumo ao subterrâneo da campanha de reeleição de Dilma Rousseff.

A secretária da Odebrecht Maria Lúcia Tavares foi peão negligenciado com alto potencial destrutivo. Pouca gente havia prestado atenção a sua existência até esta Folha revelar o rocambolesco episódio de sua libertação mediante um acordo de delação premiada.

Quando seus advogados chegaram à PF com o alvará de soltura, ela já havia deixado o local por uma porta lateral e cortado completamente os contatos com a Odebrecht, companhia a quem serviu diligentemente como contadora das planilhas com pagamentos clandestinos.

Maria Lúcia controlava os pagamentos feitos a "Feira", codinome do marqueteiro da campanha presidencial, João Santana, e de sua mulher, Mônica.

Maria Lúcia decifrou os códigos em que nomes de frutas e esportes ocultavam a entrega a granel de dinheiro vivo. Suas "traduções" puseram no mapa da Lava Jato o Porto Maravilha, menina dos olhos de Eduardo Paes (PMDB-RJ), e o estádio do Corinthians, mastodonte eleitoral do cartola Andrés Sanchez (PT-SP).

Como numa partida de xadrez, suas informações estreitaram a margem de manobra de Marcelo Odebrecht e executivos do grupo, empurrando-os à delação premiada. Ainda é cedo, contudo, para prever os efeitos do acordo sobre o quarto maior conglomerado privado do país.

Peões podem ser como carros-bomba: ninguém presta atenção até explodirem.