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    Guilherme Wisnik

    Haddad entrega para o seu sucessor um conjunto de valores

    26/12/2016 02h00

    Em junho, escrevi sobre o projeto Ligue os Pontos, realizado pela Prefeitura de São Paulo, e apresentado na 7ª edição da Bienal de Arquitetura de Roterdã.

    Ocorre que, com essa mesma ação, a cidade de São Paulo ganhou, agora em novembro, o grande prêmio Mayors Challenge 2016, oferecido pela Bloomberg Philanthropies para projetos de inovação pública, que esse ano focalizou a América Latina e o Caribe. Para tanto, a capital paulista bateu cidades como Medellín e Bogotá, que têm sido consideradas, há vários anos, exemplos mundiais de transformação através de equipamentos públicos.

    Ora, é preciso dizer que, embora tenha realizado algumas ações urbanas notáveis, como a pedestrianização da Times Square, Michael Bloomberg, fundador da organização, não fez uma administração exatamente progressista à frente da cidade de Nova York (2002-2013).

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    O prefeito Fernando Haddad cumprimenta Michael Bloomberg, presidente da Bloomberg Philantropies
    O prefeito Fernando Haddad cumprimenta Michael Bloomberg, presidente da Bloomberg Philantropies

    Igualmente, ao anunciar o grande prêmio para a cidade de São Paulo em seu website, a fundação não apresenta a cidade por imagens de sua borda rural, área à qual o projeto premiado se refere, e sim com uma foto dos edifícios espelhados da marginal Pinheiros e da ponte estaiada. Trata-se, portanto, de uma imagem de "cidade global" que parece aspirar, com a chancela do prêmio, à condição de "inteligente".

    Tais ponderações, contudo, não significam, a meu ver, nenhum demérito. Apesar disso, o prêmio representa o justo e importante reconhecimento internacional às ações vanguardistas da gestão Fernando Haddad (PT) na Prefeitura de São Paulo (2013-16), em linha divergente à apreciação demonstrada pelo eleitorado paulistano na última eleição. Ademais, Ligue os Pontos é não apenas uma ação pertinente e original no caso de São Paulo, como também exemplar, podendo ser estendida para outras cidades.

    Trata-se de um projeto intersecretarial de incentivo à agricultura orgânica familiar nas bordas da cidade, promovendo assim a contenção da urbanização dessas áreas –muitas de proteção a mananciais– e, portanto, a preservação ambiental.

    Para tanto, envolve o estímulo à produção, a facilitação dos sistemas de armazenagem e transporte das mercadorias, a conexão com possíveis compradores, como feiras de orgânicos, e a ampla aquisição desses alimentos pela prefeitura, para uso nas merendas escolares.

    Além da política direta de incentivo e compra, o projeto –que já vem sendo implementado há mais de um ano– inclui a criação de uma plataforma digital que favorece o encontro dos possíveis participantes dessa cadeia produtiva. Que é, também, uma cadeia de valor ligada à sustentabilidade e à conexão entre as escalas local e metropolitana.

    São Paulo, desse modo, além dos expressivos recursos que recuperou com o desmonte da máfia do ISS e a renegociação da dívida, recebe também, como legado, um prêmio de US$ 5 milhões (R$ 16,4 milhões, aproximadamente) para ser investido em suas áreas de borda.

    Haddad, assim, entrega para o seu sucessor não só uma "casa arrumada", mas também um conjunto de valores arduamente testados e conquistados em quatro anos.

    Sabemos que há coisas que não andam para trás. E quero crer que, nos próximos anos, a população de São Paulo zelará por essas conquistas recentes, lutando não apenas pela sua manutenção como também pelo aprofundamento de muitos desses valores.

    guilherme wisnik

    Escreveu até janeiro de 2017

    É professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e crítico de arte.

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