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    Guilherme Boulos

    Em defesa de Chico e Jean

    19/11/2015 03h00

    No dia 13 de outubro, o PSOL ­juntamente à Rede Sustentabilidade e parlamentares de outros cinco partidos- pediu a cassação do mandato de Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Os motivos para tanto o Brasil todo conhece. Os motivos pelos quais Cunha ainda não está cassado e preso são mais obscuros.

    Perito em navegar na pequena política, o presidente da Câmara vai se mantendo de pé. E ainda encontra tempo para aplicar a velha estratégia da vendetta, usando seus peões para contra-atacar.

    Quinze dias depois da ação contra Cunha, o deputado Paulinho da Força (SD-SP) entrou no Conselho de Ética da Câmara com um inusitado pedido de cassação de Chico Alencar, líder da bancada do PSOL e um dos principais acusadores de Cunha.

    O argumento do pedido evidencia o casuísmo: requenta supostas irregularidades nas contas de campanha de Chico, aprovadas pela Justiça Eleitoral e já analisadas por um procedimento do Ministério Público, que decidiu pelo arquivamento. Chico é conhecido por sua trajetória limpa e em defesa das causas populares. Seus méritos são reconhecidos até pelos adversários.

    Já de Paulinho não se pode dizer o mesmo. Paulinho representa um trágico encontro do sindicalismo com a política: carrega os piores vícios das duas atividades e poucas das virtudes.

    Como sindicalista é um pelego notório, acusado inclusive de evitar greves nas empresas que financiaram sua campanha. Como deputado é réu no Supremo por desvios no BNDES e foi condenado pelo TRF (Tribunal Regional Federal) por improbidade administrativa. Coroa agora esta trajetória atuando como office-boy de Eduardo Cunha para atacar Chico Alencar.

    Mas a vendetta do presidente da Câmara não parou por aí. Na semana passada entrou em cena outro peão, João Rodrigues (PSD-SC), desta vez pedindo a cassação do deputado Jean Wyllys (PSOL/RJ), também opositor ferrenho de Cunha e representante emblemático da luta LGBT no Congresso.

    O argumento agora é "quebra de decoro parlamentar", utilizando-se da merecida resposta dada por Jean dias antes a acusações do deputado. João Rodrigues chamou Jean de "escória" e foi Jean quem quebrou o decoro...

    Aliás, por falar em decoro, Rodrigues foi aquele deputado flagrado em maio por jornalistas assistindo vídeos pornográficos durante a seção da Câmara. Na ocasião definiu o gesto como "brincadeirinha". É este o guardião do decoro.

    Quem será a próxima vítima de Cunha e suas acusações fajutas?

    Ivan Valente (PSOL-SP), que o tem enfrentado na CPI da Petrobrás? Alessandro Molon (Rede-RJ)? Ou algum dos 40 deputados de outros partidos que assinaram de maneira avulsa o pedido de cassação?

    A estratégia de Eduardo Cunha é de vingança e intimidação. Submete a Câmara ao objetivo de salvação do seu pescoço. E para isso patrocina uma lógica doentia de inversão de valores: os legítimos acusadores tornam-se acusados.

    Sua lógica é a dos algozes da Inconfidência, nos versos de Cecília Meireles: "Toda vez que um justo grita, um carrasco vem calar. Quem não presta fica vivo, quem é bom mandam matar".

    Só esquece-se talvez de que nas ruas os brados são outros.

    Formado em filosofia pela USP, é membro da coordenação nacional do MTST e da Frente de Resistência Urbana.

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