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    Gustavo Patu

    Incômodo

    01/03/2017 02h00

    Pedro Ladeira - 30.dez.2016/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 30-12-2016, 12h00: O ministro Henrique Meirelles e o embaixador da França Laurent Bili durante Cerimônia de Assinatura da Adesão do Brasil ao Clube de Paris, no ministério da fazenda. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
    O ministro Henrique Meirelles durante cerimônia de assinatura da adesão do Brasil ao Clube de Paris

    Em seus anos de presidente do Banco Central, o hoje ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, valia-se de uma surrada analogia entre a política de juros e as torneiras de água quente e fria.

    Leva tempo até que o corte das taxas do BC resulte em melhora da economia, pregava Meirelles a petistas ansiosos no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, assim como a água do banho demora a esquentar, em especial nos hotéis, enquanto abrimos a torneira da esquerda.

    Sem a necessária paciência para testar aos poucos a temperatura, corre-se o risco de uma queimadura no chuveiro ou de aquecimento insustentável do consumo, que levará ao aumento dos preços.

    Há o tempo da economia e o da política, e os governos tendem a ser bem-sucedidos quanto os dois se harmonizam, seja por sorte, competência ou oportunismo. Dilma Rousseff, em seu primeiro mandato, abriu demais e antes da hora a água quente da queda dos juros.

    Em consequência, buscou a reeleição em 2014 negando a óbvia aceleração inflacionária, que a obrigaria a despejar uma ducha gelada sobre o país no início de um segundo mandato que não concluiu.

    Só agora, com o avanço dos ajustes conduzidos por Meirelles na Fazenda, o BC retoma a redução de suas taxas, que ainda se mantêm em patamares incompatíveis com o cenário global de juros no chão.

    O importante, porém, é que a debilidade da economia e a inflação declinante permitem, em tese, a continuidade do ciclo de queda pelos próximos meses –mais precisa e convenientemente, até o início ou meados do próximo ano.

    A se confirmarem tais expectativas, mais a aprovação de qualquer reforma da Previdência capaz de tornar viável o teto finalmente estabelecido para os gastos públicos, a eleição presidencial de 2018 será disputada em circunstâncias muito mais favoráveis que a de quatro anos antes.

    Guardadas todas as proporções, o sonho governista remete ao Plano Real de Itamar Franco e FHC, lançado no ano eleitoral de 1994, quando a superação da crise da dívida externa e da hiperinflação deixou em segundo plano os escândalos de corrupção e o descrédito dos políticos.

    Nem está no horizonte uma euforia como a da criação da nova moeda, nem o caso dos anões do Orçamento da época se compara ao que se desvenda atualmente na Petrobras. Ainda assim, o cálculo não é desprovido de lógica.

    Em tudo funcionando dessa maneira, restará de todo modo um incômodo que independe de preferências partidárias: as transformações econômicas mais importantes desde a restauração da democracia brasileira terão sido promovidas por governos que sucederam processos de impeachment, por presidentes que não foram eleitos para tal.

    gustavo patu

    Editor de 'Opinião'. Na Folha, já foi repórter especial, coordenador de Economia em Brasília e secretário-assistente de Redação

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