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    Hélio Schwartsman

    "Schadenfreude"

    09/09/2014 02h00

    SÃO PAULO - Não é lá muito cristão, mas confesso sentir uma ponta de prazer sempre que políticos de alto coturno se metem num escândalo com potencial de destroná-los.

    É cedo para traçar prognósticos acerca das novas denúncias de corrupção na Petrobras. Ainda não sabemos sequer se elas estão amparadas em provas, mas admito que sorri ao ler alguns dos nomes que teriam sido citados nos depoimentos de Paulo Roberto Costa. Os alemães têm até uma palavra para designar a alegria que experimentamos quando tomamos conhecimento da desgraça de terceiros: "Schadenfreude".

    É um sentimento complicado. Para começar, ele é mais a exceção do que a regra. Normalmente, ao ver um semelhante sofrer, nós sofremos com ele. Basta olhar alguém dando uma martelada no dedo para quase sentirmos sua dor. É a empatia, a cola que dá liga à sociabilidade humana.

    Há situações, porém, em que a empatia dá lugar à "Schadenfreude". A mais frequente é quando a vítima é alguém que identificamos como de fora do grupo. Em tempos modernos, isso se traduz no prazer que temos, por exemplo, ao ver o time rival sofrer uma goleada. Mas a "Schadenfreude" pode ocorrer também em contextos intragrupais. E, nestes casos, tem a ver com status. É mais comum quando o infortúnio alheio nos beneficia, ou quando atinge alguém que invejamos ou quando o percebemos como um ato de justiça cósmica. É nessa última categoria, penso, que entram os escândalos políticos.

    E aí, talvez por apego a narrativas dramáticas, temos especial prazer quando a punição adquire carga moral. Melhor do que ver um poderoso cair, só assistir à queda de um político ultraconservador apanhado num escândalo sexual, ou de um promotor raivoso pego recebendo propina.

    A "Schadenfreude" pode não ser bonita, mas é humana. É a forma canhestra pela qual nossa mente tenta conciliar impulsos contraditórios que moldaram nossa moralidade.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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