SÃO PAULO - Embora não as utilize, tenho uma leve simpatia pelas ciclovias, ciclofaixas etc. Acho que elas oferecem uma alternativa de transporte à população, ainda que limitada pelo relevo e pelo suor.
De resto, a cada faixa que se abre, dificulta-se um pouco mais a movimentação dos carros, o que é preciso mesmo fazer se queremos disseminar a cultura de que é mais civil, mais barato e mais rápido deixar o veículo particular na garagem e pedalar ou tomar o transporte público.
Apesar dessas considerações, creio que o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, está deixando escapar uma grande oportunidade.
O processo de expulsão dos carros nunca é total e gera uma série de consequências econômicas. Com menos vagas para parar nas ruas, quem insiste em usar seu veículo precisa recorrer a estacionamentos particulares. Hoje, quem se apropria dessas receitas são os donos de terrenos e as empresas especializadas em administrar esse tipo de negócio. De modo análogo, o direito de circular nas faixas reservadas a ônibus foi estendido aos taxistas, que se apoderam do prêmio monetário gerado pela escassez de espaço.
Não tenho nada contra a iniciativa privada, muito pelo contrário. Mas, no caso, faria muito mais sentido que os recursos retirados daqueles que não abrem mão de usar o transporte individual tivessem uma apropriação pública, a ser investida na melhoria da mobilidade, e não por alguns poucos particulares bem posicionados. E, teoricamente, não é difícil mudar o jogo. Basta que surja algum prefeito com a coragem de instituir o pedágio urbano.
Congestionamentos são uma maneira caótica de arbitrar os conflitos decorrentes de uma oferta de vias públicas muito menor do que a demanda. O meio mais democrático de arbitrar essa disputa é colocar um sobrepreço no espaço e usar os recursos arrecadados para fazer o sistema rodar com mais fluidez.
É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.