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    Hélio Schwartsman

    Nada mais que a verdade

    10/12/2014 02h00

    SÃO PAULO - A Comissão Nacional da Verdade (CNV) entrega hoje seu relatório final aos presidentes dos três Poderes e à sociedade. O texto não deve trazer nenhuma revelação estonteante nem provocar grandes mudanças na interpretação historiográfica daqueles anos. Eu diria que a comissão fez o possível dados os limites da lei que a instituiu e da falta de colaboração dos órgãos que participaram da repressão.

    O que chama a atenção não é tanto o alcance limitado do relatório (comissões governamentais raramente revolucionam alguma coisa), mas as reações extremadas ao trabalho da CNV, no melhor estilo flá-flu que se assenhorou da política brasileira.

    Do lado das vítimas há uma insistência, a meu ver um pouco despropositada, em tentar levar para a cadeia os perpetradores que ainda estão vivos. Eu receio que o Brasil já tenha perdido –e mais de uma vez– a oportunidade histórica de punir os crimes da ditadura. Tentar fazê-lo 40 anos após os fatos já não faz muito sentido, uma vez que os condenados seriam pessoas muito diferentes daquelas que cometeram os delitos. O eu autobiográfico, que é o que nos faz ver uma continuidade entre a criança e o velho, é bem mais ilusório do que gostamos de supor.

    Do lado dos perpetradores a desmedida é pior. Eles insistem em que a CNV foi parcial ao analisar apenas os crimes cometidos pela repressão, deixando de lado os delitos dos guerrilheiros. Estamos carecas de saber que organizações de esquerda que pegaram em armas mataram inocentes. Mais ainda, a maioria desses grupos não pretendia restaurar a democracia, mas sim instalar algum tipo de ditadura do proletariado por aqui.

    Ainda assim, os representantes do Estado tinham o dever legal e moral de não torturar nem assassinar os militantes. Não houvesse agentes públicos metidos com esses crimes a comissão nem existiria. Cobrar que o outro lado seja investigado é manobra diversionista das mais toscas.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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