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    Hélio Schwartsman

    De cor e salteado

    02/05/2015 02h00

    SÃO PAULO - Ricardo Semler escreveu na página ao lado, na última terça, um interessante artigo sobre educação. Concordo com a mensagem central do texto, que é a de que o aprendizado não precisa ser uma tortura (ao menos, não sempre). Perseguir bons resultados com base no chicote, como fazem alguns países asiáticos, pode não ser uma boa estratégia. Também fecho com ele na ideia de que a divisão do conhecimento nas disciplinas estanques que ainda utilizamos envelheceu.

    Receio, contudo, que o empresário cometa uma injustiça ao imprecar contra a velha decoreba. É claro que na era do Google não faz muito sentido guardar informações enciclopédicas na memória. Só que hoje existe um crescente corpo de pesquisas sugerindo que decorar, mais especificamente o ato de recuperar de uma memória, tem valor pedagógico.

    Um dos principais estudiosos do assunto é Jeffrey D. Karpicke, que, em 2011, publicou na "Science" um interessante trabalho em que comparava o desempenho de voluntários que estudaram um texto científico se valendo de um método que enfatiza a memória (leitura seguida de um exercício de fixação) com o de alunos que usaram a técnica do mapa conceitual, na qual leem o texto e depois desenham diagramas relacionando os conceitos apresentados.

    Os que se valeram do método mnemônico tiveram melhor pontuação quando testados uma semana depois. Isso, porém, já era esperado. A surpresa foi constatar que a turma da decoreba se saiu melhor tanto nas perguntas que envolviam a mera reprodução das ideias originais como nas que exigiam que eles fizessem inferências, estabelecendo novas conexões entre os conceitos.

    Os mecanismos pelos quais isso ocorre não são bem conhecidos. Uma hipótese é a de que, como a cada vez que acessamos uma memória, nós a alteramos, esse processo de recuperação tem papel bem mais criativo do que suspeitam nossas intuições.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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