SÃO PAULO - O bonito na teoria da evolução é que ela constitui uma lei universal. Não sabemos se há vida em outros planetas, mas, se houver, e ela for constituída por unidades que buscam perpetuar-se, estão sujeitas a variação e competem por recursos, então as regras descobertas por Darwin se aplicarão.
Nem precisamos ir a outros planetas para constatá-lo. O fenômeno está aqui mesmo no Enem. O que mais salta aos olhos no ranking das notas é o poder da seleção. As melhores escolas (ou, ao menos, as mais bem pontuadas) são as que, de algum modo, podem selecionar bons alunos.
Isso fica escancarado no setor público, onde a diferença entre as instituições que promovem vestibulinhos, como as escolas técnicas ou as federais, e a rede comum, aberta a qualquer aluno, é importante. A nota média das dez escolas técnicas de melhor desempenho no Estado de São Paulo fica 75 pontos (3/4 de desvio padrão) acima da média das dez instituições estaduais regulares mais bem posicionadas.
Entre as privadas, o mecanismo é só um pouco mais sutil: a mensalidade. A renda dos pais é o fator que permite prever com maior precisão o desempenho escolar do aluno. Um modo eficaz para uma escola subir no ranking é simplesmente elevar o valor da mensalidade.
O Enem mimetiza outro fenômeno da biologia, a corrida armamentista evolutiva. Como a seleção é o elemento-chave e pode resultar em prêmio –escolas mais bem colocadas saem valorizadas–, algumas instituições começaram a usar artifícios para atrair os melhores estudantes ou mesmo a criar unidades compostas exclusivamente por geninhos. Para ajudar a desfazer essa ilusão, o MEC passou este ano a revelar também a taxa de permanência dos alunos, acusando assim os colégios que "importam" muitos estudantes no terceiro ano.
Nas próximas edições, podemos esperar novas estratégias de escolas para aparecer bem no ranking.
É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.