SÃO PAULO - Em junho de 2013, numa de suas preleções econômicas, Dilma Rousseff sugeriu que nos livrássemos do espectro do Velho do Restelo, o personagem camoniano que agourava os navegadores portugueses. A presidente usou a invulgar imagem literária para dizer que devemos evitar o pessimismo.
De lá para cá, a economia brasileira afundou tanto que as análises que pareciam pessimistas na ocasião se revelaram otimistas. Apesar disso, empenho-me no exercício dilmista de tentar ver a presente situação com confiança e jovialidade máximas.
Vestindo lentes leibnizianas –vivemos no melhor dos mundos possíveis–, a primeira coisa que salta aos olhos é a qualidade do material humano na nossa política. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, por exemplo, é um gênio dos negócios. Amealhou um respeitável patrimônio atuando no ramo de venda de carne processada para países africanos e realizando operações no mercado de capitais. Como é um pouco distraído, esqueceu-se de declarar ao Fisco todos os detalhes de sua vida econômica, notadamente os valores que eram mantidos fora do país.
E Cunha não está só. O presidente da outra casa legislativa, senador Renan Calheiros, também é um mago do empreendedorismo. Em 2007, num momento difícil de sua vida, em que era vítima de maledicentes insinuações, explicou que o dinheiro que sustentava a filha que tivera fora do casamento era fruto de seu incrível talento pecuário. Homem de visão, conseguia que seu rebanho alagoano gerasse lucros muito superiores aos auferidos por criadores de regiões bem mais produtivas.
E o Legislativo está repleto de Midas desse quilate, para os quais os próprios deuses sorriem, como foi o caso do deputado João Alves, que ganhou mais de 200 vezes na loteria.
São tantos os prodígios que me pergunto se não devemos adotar logo o parlamentarismo, para que essa gente tome de vez as rédeas do país.
É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.