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    Hélio Schwartsman

    Notáveis no ministério

    07/05/2016 02h00

    SÃO PAULO - Michel Temer cogita pôr Marcos Pereira, pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, no Ministério da Ciência e Tecnologia. Dá para conciliar ciência e religião?

    Não estamos, é claro, diante de uma incompatibilidade absoluta. Prova-o o fato de que, até o século 18, quase todos os cientistas tinham algum tipo de crença religiosa. Não é que o ateísmo não existisse, mas era um fenômeno relativamente raro.

    Isaac Newton, uma das maiores mentes científicas de todos os tempos, constitui um exemplo perturbador. Ele não só era extremamente carola como dedicou a maior parte de sua carreira a escrever sobre religião. Defendia uma interpretação literal da Bíblia e acreditava, entre outras bizarrices ocultistas, que ela trazia mensagens secretas. Suas crenças metafísicas não o impediram de criar as bases da física clássica.

    As coisas, porém, mudaram. Uma série de fatores, muito bem descritos por Charles Taylor, transformou nossa época numa era secular. Não é que a religião tenha virado pecado, mas ela se tornou apenas uma entre muitas opções. E uma que, ao menos demograficamente, não combina tanto com ciência. Enquanto 7,1% da população dos EUA se declara ateia/agnóstica, essa proporção salta para 93% entre membros da Academia Nacional de Ciências, que congrega a elite dos pesquisadores daquele país.

    O melhor modo de interpretar isso é ver religiosidade e irreligiosidade como estilos cognitivos distintos. Nos dias de hoje, pessoas que convivem melhor com números do que com papai do céu tendem a procurar as carreiras científicas. Daí não decorre que religiosos não sirvam para isso, só que sua concentração é menor.

    Voltando a Temer e o pastor Pereira –que, até onde se sabe, não é nenhum Newton–, o problema não é tanto que o candidato a ministro seja clérigo e criacionista, mas sim que um posto relevante da administração esteja sendo negociado sem qualquer preocupação com a atividade fim.

    helio@uol.com.br

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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