O capitalismo é uma besta-fera que devora tudo o que toca, destruindo até mesmo alguns dos mais elevados valores humanos, como a solidariedade? Ou será que é aquilo que está mais próximo de uma cornucópia a que a humanidade pode chegar, tendo produzido soluções inovadoras e gerado prosperidade em escalas antes nunca imaginadas?
Nossos cérebros adoram esse tipo de dualismozinho, mas ele dificilmente se revela uma boa descrição da realidade. No caso do capitalismo, parece mais prudente apostar que ele seja as duas coisas ao mesmo tempo. Essa ao menos é a tese de Geoff Mulgan, autor de "The Locust and the Bee" (o gafanhoto e a abelha), obra em que sustenta que o capitalismo é essencialmente um sistema em movimento, no qual tendências fortemente predatórias (o gafanhoto) se combinam com forças construtivas (a abelha) para formar um amálgama cuja marca é a transformação. Para Mulgan, Marx errou ao subestimar a capacidade do capitalismo de responder e se adaptar a ameaças e pressões políticas. Conseguiu, até, disseminar riqueza -e sem perder a capacidade de, simultaneamente, concentrá-la.
Dono de uma visão sempre equilibrada, o autor mostra como o sistema vai tropeçando em meio a suas ambiguidades, mas sem chegar a se estatelar no chão. Para fazê-lo mergulha na história, recorre a estudos e não deixa de lado reflexões filosóficas. Prognostica, por exemplo, que o enorme sucesso do capitalismo em produzir coisas materiais reduz o significado das tecnologias físicas, o que deverá conferir peso cada vez maior a indústrias como a da saúde, da educação e da ecologia.
Mulgan no fundo é um otimista. Para ele, se nós formos razoavelmente sábios, a enorme capacidade de adaptação do capitalismo nos levará a um futuro melhor, mais aberto, mais atento a relações do que ao material e mais ligado à vida. A conferir.
É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.