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    Hélio Schwartsman

    Desejo e sexo

    11/09/2016 02h00

    SÃO PAULO - Fabrice del Dongo é o herói do romance "A Cartuxa de Parma", de Stendhal. Numa das passagens mais memoráveis dessa obra, o jovem é lançado em plena batalha de Waterloo, mas se encontra tão próximo dos acontecimentos que só vê confusão, sem entender nada do que está ocorrendo.

    Com o sexo, mais especificamente a moral sexual e as leis que regulam tópicos como casamento, prostituição, contracepção, estupro, obscenidade, homossexualismo, é a mesma coisa. Lidamos aqui com percepções que estão em fluxo contínuo, mas estamos tão perto das mudanças que não as percebemos com clareza. "The Boundaries of Desire" (limites do desejo), de Eric Berkowitz, traz um pouco de ordem a essa balbúrdia.

    O livro é uma espécie de enciclopédia da moral sexual no Ocidente com ênfase na legislação. Mostra como nossas ideias sobre sexo mudaram nos últimos cem anos e como as leis sempre se encarregaram de oferecer soluções ilógicas para os problemas que surgiam. "The Boundaries" é um manancial de informações chocantes. Conta, por exemplo, que, nos anos 50, na liberal Holanda, mulheres precisavam da permissão escrita de seus sacerdotes para que seus médicos lhes explicassem como evitar filhos usando a tabelinha.

    É claro que isso pode ser visto como uma evolução, considerando que, nos anos 20, vários países europeus tornaram crime qualquer método de contracepção, e livros médicos que tratavam do assunto eram atacados como pornografia.

    Berkowitz nos oferece uma visão liberal do assunto, destacando as injustiças causadas por leis mal pensadas, como os registros de "predadores sexuais" comuns nos EUA ou a criminalização do "tráfico de pessoas", mesmo quando a prostituição é uma escolha legítima da mulher.

    Nossa espécie nunca primou pela racionalidade, mas é só colocar sexo na história para que nossas doidices emerjam sem disfarces.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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