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    Hélio Schwartsman

    De tripas e direitos

    03/12/2016 02h00

    Tiago Mazza/FramePhoto/Folhapress
    ulo - 31/10/2015 - Manifestantes mulheres carregam caixão fictício representando as mulheres que morrem devido ao aborto clandestino durante protesto contra o 'PL do Aborto' e contra o presidente da Câmara Eduardo Cunha, na Av. Paulista em São Paulo na tarde deste sábado, dia 31. O PL 5069/13 de autoria do presidente da câmara Eduardo Cunha (PMDB) dificulta o aborto legal, punindo a quem facilitar a pratica, e restringe a venda de medicamentos abortivos. Foto: Tiago Mazza/FramePhoto. *** PARCEIRO FOLHAPRESS - FOTO COM CUSTO EXTRA E CRÉDITOS OBRIGATÓRIOS ***
    Manifestação pela legalização do aborto na av. Paulista, em São Paulo

    SÃO PAULO - Ao que tudo indica, integrantes do Supremo Tribunal Federal estão preparando o terreno para discutir a descriminalização do aborto por considerar a legislação que pune a interrupção da gravidez incompatível com os direitos e garantias fundamentais das mulheres. Esse pelo menos foi o argumento vitorioso no julgamento de um habeas corpus concedido pela Primeira Turma do STF. A decisão só vale para este caso, mas abre um precedente para juízes de primeira instância que estejam dispostos a segui-la e pressiona o plenário da corte a abordar o tema numa ação "erga omnes", que valha para todo o país.

    Concordo em gênero, número e caso com argumentação do ministro Luís Roberto Barroso, que relatou o processo. Vou um pouco mais longe e afirmo que a mais nobre missão de uma corte constitucional é estabelecer a esfera de liberdade dos cidadãos na qual nem mesmo os legisladores podem interferir. Penso que o aborto nos estágios iniciais da gravidez fica nesse território, ao lado de outros temas polêmicos como o uso de drogas para fins recreativos e a eutanásia a pedido do paciente.

    Proponho ao leitor um experimento mental. Imaginemo-nos num cenário rawlsiano no qual temos a incumbência de definir a estrutura básica da sociedade em que viveremos. A pegadinha é que estamos sob o véu da ignorância. Não sabemos se seremos homens ou mulheres, ricos ou pobres, burros ou inteligentes, doentes ou saudáveis, se pertenceremos à maioria religiosa ou a uma minoria.

    Nessas circunstâncias eu não hesitaria um instante em escolher o plano de Estado que garantisse o máximo de liberdades individuais, pois me parece preferível abrir mão do "direito" de oprimir o próximo a correr o risco de ser eu próprio oprimido.

    Trocando em miúdos, não me parece que seja razoável um desenho institucional que transfira ao conjunto da sociedade a decisão sobre o que faço com minhas entranhas.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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