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    Hélio Schwartsman

    Sonhos filosóficos

    25/12/2016 02h00

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    Livro "The Dream of Enlightenment", de Anthony Gottlieb
    Livro "The Dream of Enlightenment", de Anthony Gottlieb

    SÃO PAULO - Frequentemente leitores me pedem que lhes recomende uma história da filosofia. Por automatismo, acabava sugerindo a de Émile Bréhier e a organizada por François Châtelet, que utilizei na graduação, ou a de Bertrand Russell, que depois li por prazer. Todas elas têm virtudes, mas me sentia um pouco mal por não poder indicar algo que fosse ao mesmo tempo mais contemporâneo e dirigido a um público de não especialistas.

    Meus problemas (quase) acabaram. Foi lançado este ano "The Dream of Enlightenment" (o sonho do Iluminismo), de Anthony Gottlieb, que abrange a filosofia moderna, de Descartes a Voltaire, Rousseau e os "philosophes". É a sequência de "The Dream of Reason" (o sonho da razão), publicado em 2000, que vai dos gregos até a Renascença, que eu até então não conhecia e é quase tão bom como o primeiro.

    Gottlieb, que é mais jornalista do que acadêmico —ele foi por uma década editor-executivo da "Economist"—, consegue a proeza de tornar cada capítulo de seus livros uma história realmente gostosa de ler, que mistura lances biográficos com as ideias dos autores, sem cometer simplificações e traições conceituais.

    Ao contrário, um dos principais méritos dos "Dreams" é que Gottlieb destrói muitas mistificações que cercam a história da filosofia. Ele mostra, por exemplo, que a "batalha" para determinar se foi Hobbes ou Rousseau quem melhor descreveu a natureza humana é uma invencionice contemporânea que não resiste a uma leitura mais atenta dos originais. Ao detonar os lugares-comuns que infestaram a história da filosofia, Gottlieb permite que cada autor apareça com todas as suas nuanças, complexidades e contradições.

    Para pôr um fim definitivo a meu problema, porém, Gottlieb tem de terminar o último volume, que irá de Kant até o presente. Só espero que ele não precise de outros 16 anos para fazê-lo: 2032 está longe.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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