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    Hélio Schwartsman

    SUS dá banana para a ciência

    26/04/2017 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 13-04-2017, 15h00: Terapias alternativas no SUS. Sessão de Shantala para bebês oferecida no posto de saúde do Riacho Fundo II, cidade da região metropolitana de Brasília. Na foto a enfermeira Mírian Carmo e as mães (no sentido horário), Marciléia Freitas, mãe da Lara; Lorena Andrade, mãe do Alexander; Patrícia Nascimento, mãe do Erick. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, COTIDIANO) ***ESPECIAL***
    Sessão de shantala, prática de massagem originada na Índia, em posto de saúde no Distrito Federal

    SÃO PAULO - O tom da Folha era de lamento. Na primeira página, ela deu: "Oferta de terapias alternativas no SUS ainda é baixa". Na manchete interna, estampou: "Cresce busca por terapia alternativa no SUS, mas oferta ainda é pequena". Será que devemos mesmo deplorar que práticas como reiki, homeopatia, crenoterapia, reflexoterapia etc. ainda não tenham se disseminado no sistema público de saúde?

    O primeiro ponto a destacar é que essas terapias tendem a funcionar, ainda que não pelas razões derramadas por seus entusiastas. Um exemplo. Para o reiki agir como querem seus praticantes, seria preciso revisar quase tudo o que sabemos de física e admitir que forças misteriosas jamais registradas por nossos instrumentos fluem pelas mãos de alguns iluminados e têm poder curativo.

    Só que a física também nos diz que o cérebro humano é um órgão complexo. Entre suas extravagâncias está o efeito placebo, que faz com que os sintomas de certas doenças diminuam pela simples sugestão de que o paciente está recebendo um tratamento. Descrevemos o efeito placebo meio pejorativamente como algo que está "só" nas nossas cabeças, mas ele é real, mensurável e poderoso.

    Como essas práticas alternativas funcionam ao menos como efeito placebo —se há benefícios adicionais, eles ainda precisam ser demonstrados em estudos controlados e metanálises—, não há dúvida de que podem fazer o paciente sentir-se melhor. Considerando-se que elas dificilmente fazem mal, não haveria grande problema em adotá-las.

    Eu, porém, faço duas objeções. A primeira diz respeito a custos. Será que, num instante em que faltam recursos para tudo no SUS, faz sentido investir em práticas cuja eficácia extraplacebo não foi estabelecida? A outra é de ordem ética. Ao incorporar a litania mística que acompanha essas terapias e pô-la no mesmo nível da medicina baseada em evidências, o SUS dá uma banana para a ciência.

    hélio schwartsman

    É bacharel em filosofia, publicou 'Pensando Bem...' (Editora Contexto) em 2016.
    Escreve às terças, quartas, sextas, sábados e domingos.

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