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    Henrique Meirelles

    Disciplina ou abismo fiscal

    06/01/2013 03h04

    É importante entender o drama de fim de ano nos EUA para evitar o chamado "abismo fiscal" e como essa discussão pode ser útil ao Brasil.

    Hoje, é consenso que expansão no gasto público ou diminuição da tributação geram aumento da atividade econômica. Quando o governo gasta mais, expande a atividade. Quando arrecada menos e deixa mais recursos ao setor privado, este também gasta mais e expande a atividade.

    Essa conclusão agradou a muitos formuladores de política econômica e gestores públicos. É interessante achar que não só se está gastando mais, como se está contribuindo para elevar a atividade. O problema é que, na medida em que se eleva o gasto e se diminui a arrecadação, esse diferencial é coberto por empréstimos via emissão de títulos da dívida pública.

    Isso pode ser feito com facilidade, enquanto existirem investidores dispostos a financiar o governo a taxas baixas. Mas, a partir de certo momento, os juros começam a subir e, após certos níveis de endividamento, os governos começam a perder capacidade de se financiar.

    Já vivemos essa crise no Brasil e em outros países emergentes várias vezes, e, hoje, a vemos na Grécia e em outros países europeus. É o problema do país que atinge os limites do endividamento, já que a solução de longo prazo passa a ser a redução da dívida pública, com corte de gastos e mais impostos. No curto prazo, isso reduz a atividade e pode reduzir a arrecadação. Dependendo da escala, gera ciclo vicioso, como na Grécia.

    O desafio ao país que ainda não atingiu essa fase dramática é tomar as medidas certas para evitá-la. É onde se situa a discussão americana.

    A questão dos EUA é como evitar que a dívida pública siga subindo na velocidade das últimas décadas e comprometa sua capacidade de se financiar. Com esse fim, medidas draconianas de aumento de impostos e corte de gastos foram acordadas no Congresso para serem implementadas automaticamente, na ausência de acordo para reequilibrar o Orçamento até o fim de 2012. A conjunção dessas medidas levaria a uma curta recessão econômica, o "abismo fiscal".

    O resultado final trouxe um pouco para cada lado e não satisfez ninguém completamente. Não prevê alta de impostos tão agressiva, como queriam os democratas, nem corte de despesas substancial, como queriam os republicanos.

    A lição é simples: no momento em que a dívida começa a crescer de forma a sinalizar insustentabilidade no médio prazo, todas as soluções são ruins.

    A melhor solução para todos, e especialmente para o Brasil, é preservar a disciplina fiscal duramente conquistada e manter a dívida pública controlada para que não tenhamos de enfrentar esse dilema de Sofia diante de muitos países.

    HENRIQUE MEIRELLES escreve aos domingos nesta coluna.

    henrique meirelles

    Escreveu até maio de 2016

    É presidente do Conselho da J&F. Foi presidente do Banco Central de 2003 a 2010.

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