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    Henrique Meirelles

    Ancorando o debate

    24/01/2016 02h00

    Participo de discussões com investidores globais nas quais são analisados vários países. Anos atrás, quando falávamos do México, foi pontuado que era ano eleitoral e existia grande chance de vitória de candidato presidencial populista.

    Apesar disso, os investidores mostraram tranquilidade. Como o Banco Central do país era independente e seu presidente e diretores tinham mandatos longos à frente, não havia a possibilidade de um novo chefe de governo alterar substancialmente, num único mandato, as decisões sobre política monetária ou cambial.

    O ponto central no intenso debate sobre a decisão do BC brasileiro de manter a taxa de juros inalterada é a autonomia da instituição. A controvérsia foi resolvida de forma permanente e simples na maioria das economias relevantes via instituição da independência legal do BC –o que significa na prática que a sua diretoria terá mandatos estabelecidos por lei para cumprir os objetivos formulados pelo Executivo.

    E por que muitos países adotaram a medida em lei? A razão é clara: embora a inflação baixa seja muito popular, medidas de combate à inflação podem ser no curto prazo impopulares. A defasagem de tempo entre o aumento dos juros e a queda da inflação é grande. E passa muitas vezes por queda da atividade econômica, o que poucos políticos querem assumir.

    O problema colocado é que o Brasil está em recessão e o desemprego cresce –fatores que em geral levam à queda da inflação ou deflação. Mas nossa inflação é alta.

    Nessa difícil conjunção, é inevitável debater se o BC deve subir mais os juros. Economistas competentes argumentam que, com inflação e expectativa de inflação altas, o único caminho é subir os juros, o que ajuda a criar a estabilidade necessária ao crescimento. Outros economistas reputados dizem que, dada a recessão, a inflação convergirá à meta nos próximos anos.

    Em qualquer circunstância, porém, não há dúvida de que é fundamental dar ao BC a capacidade de ancorar as expectativas inflacionárias e assim conter reajustes inerciais. E aí voltamos à independência. Ela elimina eventuais desconfianças de que influência política com interesses de curto prazo impediriam o BC de tomar as medidas mais adequadas.

    A solução encontrada até agora em diversos países para resolver esse problema de forma permanente e impessoal foi dar independência ao BC. Isso não só elimina boa parte das dúvidas como despolitiza a discussão, que fica mais técnica.

    É raro em países com BC independente ver políticos importantes querendo influenciar decisões sobre juros. Nesses países, os números mostram maior confiança e eficiência na condução da política monetária, o que eleva seus benefícios a toda a sociedade.

    henrique meirelles

    Escreveu até maio de 2016

    É presidente do Conselho da J&F. Foi presidente do Banco Central de 2003 a 2010.

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