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    Jaime Spitzcovsky

    A escuridão iluminada

    25/08/2013 02h30

    Li, numa revista especializada, sobre a criação de um dispositivo para cães cegos evitarem o choque com obstáculos. O animal recebe a vibração disparada por um "radar" ao se aproximar de algum objeto, na distância de cerca de 20 centímetros do focinho. A leitura da invenção resgatou, de golpe, memórias de Vica e Yura, samoiedas que se foram alguns anos atrás.

    Em 2007, perdi Lara, vítima de uma pancreatite fulminante. Ela tinha sete anos. Em meio à busca por explicações da morte prematura, submeti meus outros cinco samoiedas a testes de glicemia. Vica apresentou taxa altíssima, sem revelar antes nenhum sintoma.

    Entramos na rotina da aplicação de insulina. No geral, a situação se estabilizou, mas, mesmo assim, a visão foi definhando. Percebi quando ela começou a se chocar contra móveis da sala.

    A opacidade tomou conta dos olhos. Nos passeios, movimentos em falso. Improvisei uma cerca na piscina. Aposentei móveis com arestas mais pontudas.

    Também iniciei uma pesquisa sobre diabetes e catarata em cães. Conversei com veterinários e donos que haviam passado pela experiência. Convenci-me da urgência de submeter Vica à cirurgia que restabeleceria, ainda que parcialmente, sua visão.

    Ilustração Pablo Carranza

    Uma bateria de exames pavimentou o caminho para a operação. Levei-a à clínica num sábado pela manhã, e busquei-a, ainda sob efeito cadente da anestesia, horas depois. De cara, um meticuloso e trabalhoso pós-operatório.

    O resultado foi fantástico, e a qualidade de vida da Vica teve uma melhora meteórica. Seu irmão Yura, um ano depois, passou pela mesma cirurgia. Eu já estava craque no trabalho de pingar colírios.

    Tumores ceifaram as vidas dos irmãos. Morreram com mais de dez anos de idade, ganhando sobrevida com muita qualidade. Mereciam todos os esforços possíveis para lhes proporcionar uma velhice confortável e feliz.

    jaime spitzcovsky

    Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.

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