Virei avô novamente. Amora, habitante caprina do sítio, pariu uma cabritinha, ainda sem nome. Faremos uma assembleia com as crianças para decidir como ela vai se chamar. No final de semana passado, aproveitei para conhecer o rebento, pouco mais de 24 horas depois do nascimento.
Não tinha experiência em acompanhar os primeiros momentos de vida no mundo animal fora do universo canino. Vinha recentemente de mais um episódio desses, com o parto dos filhotes da Farofa, caloura da matilha, resgatada numa avenida paulistana em abril. Apesar da pouca idade e experiência, a mãe de primeira viagem saiu-se muito bem na tarefa de cuidar da prole.
| Ilustração Tiago Elcerdo | ||
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Só errou ao carregar o primeiro filhote com a boca. Colocou força a mais e dilacerou a pele recém-nascida. Mas a cicatrização veio em alguns dias, e Farofa não repetiu o equívoco. Calibrou com precisão a mordedura.
O roteiro da Amora me pareceu mais fácil. A cabritinha já nasceu com olhos abertos, saltitante atrás da mãe, ainda que cambaleante. Parecia um boneco de pelúcia ambulante.
Oksana, uma de minhas samoiedas, pariu em casa. E me proporcionou um momento ímpar. Quando começou a ter os filhotes, deixei-a a sós na sala de TV, dentro da caixa de parto, seguindo orientação veterinária. Tinha a garantia de que ela, embora jamais tivesse lido um livro do Benjamin Spock ou pedido dicas a uma parteira, tiraria de letra o desafio da maternidade.
Fiquei no recinto ao lado, com vontade de acender um charuto. Reprimi o hábito humano. Em poucos minutos, Oksana despontou na porta, com um novedio na boca. Fiquei paralisado. Ela veio até mim e soltou o pequeno ser, ainda ensanguentado, no meu colo. Interpretei como vontade de compartilhar o momento comigo.
Com o filhote nas mãos, corri até a caixa de parto. E não saí do lado da Oksana nas 24 horas seguintes.
Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.