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    Jaime Spitzcovsky

    Raças e latidos impronunciáveis

    16/02/2014 02h30

    Na infância, corria semanalmente às bancas para comprar fascículos da Enciclopédia Canina. Adquiri, ao final da coleção, a capa dura, encadernei os dois tomos, seguindo o ritual da época, e, desde meados dos anos 1970, os pesados volumes ocupam lugar de destaque em minha estante. Folheava as edições em busca de raças exóticas e de paragens distantes. Minha filha herdou o faro, mas se esbalda navegando na internet.

    Em devaneios infantis sobre raças, descartava aquelas cujos nomes mais pareciam sopa de letrinhas, um enfileirar de consoantes à la Spitzcovsky. Se sempre tive de soletrar o sobrenome, seria ainda obrigado a descrever, letra a letra, a origem do meu cão?

    Ilustração Tiago Elcerdo

    Elaborei uma lista com raças de nomes praticamente impronunciáveis para nossos hábitos tupiniquins. Lá vão alguns: o alemão kromfohrlander, o sueco schillerstovare e o suíço schweizerischer niederlaufhund. Da República Tcheca, adicionei o praský krysarík.

    Mesmo em raças comuns por aqui, encontramos nomes de difícil pronúncia. Por exemplo, dachshund. Para muitos, em vez de engripar nas quatro consoantes seguidas, é mais confortável recorrer à versão tropical, chamando-o de salsicha.

    Porém, a mais criativa solução tropicalizada encontrei num anúncio que oferecia "burrilho". Ignorante, achei se tratar de algum parente de asnos. Logo descobri que o animal em questão era um "blue heeler", versão do boiadeiro australiano (australian cattle dog).

    Simplificar nome de raças facilita também a vida de pet shops. Já vi atendentes que preencheram o item raça com a inscrição "pudi". Ou "podul". Duvido que os poddles, reis de charme e sofisticação, gostariam de ver o nome da raça tão desvirtuado.

    Outro dia conheci mais uma tropicalização. Conversava, num parque, com uma senhora que levava o mascote. "É um xistu", explicou ela. Traduzindo: era um shih tzu, a famosa raça chinesa.

    jaime spitzcovsky

    Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.

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