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    Jaime Spitzcovsky

    Trump, europeus e aiatolás

    05/06/2017 02h00

    Ebrahim Noroozi/Associated Press
    Iranian President Hassan Rouhani gives a televised speech after he won the election, in Tehran, Iran, Saturday, May 20, 2017. Rouhani says that the message of Friday's election that gave him another four-year term is one of Iran living in peace and friendship with the world. (AP Photo/Ebrahim Noroozi) ORG XMIT: ENO105
    O presidente do Irã, Hasan Rowhani, reeleito em maio

    Inflada nas últimas semanas com temas como acordo climático, visões sobre comércio internacional e caminhos da Otan, a coleção de fricções entre o paladino do "America First", Donald Trump, e a dupla europeia Angela Merkel e Emmanuel Macron pode se enrobustecer ainda mais, em breve. No radar, com potencial para gerar mais fissuras transatlânticas, as relações das potências globais com o regime teocrático do Irã.

    Trump aponta o governo iraniano como um dos principais fatores de desestabilização no Oriente Médio, propõe isolar Teerã e, assim, coloca em xeque o acordo nuclear, assinado em 2015, entre o Irã e as potências globais: EUA, China, Rússia, França, Reino Unido e Alemanha.

    Na campanha eleitoral, Trump qualificou o tratado como "o pior de todos os tempos". O polêmico entendimento se baseou na ideia de o Irã recuar de suas ambições nucleares, teoricamente distanciando-se da capacidade de construir bombas, para obter alívio em sanções comerciais e reinserção na economia global.

    Para detratores da iniciativa capitaneada por Obama, Teerã teria sido o grande beneficiário do acordo, ao não desmantelar a infraestrutura nuclear, e poder, no futuro e com economia vitaminada, retomar projetos atômicos com contornos militares.

    Assumiram tal discurso Israel e Arábia Saudita, principais rivais regionais do Irã, além de republicanos críticos da política externa de uma Casa Branca em mãos democratas.

    Obama e aliados argumentam terem arrancado importante recuo do Teerã, a ser acompanhado por rígido esquema de monitoramento interacional das instalações nucleares. Perspectivas de lucrativos negócios com o Irã também estimularam, e muito, o apetite diplomático das potências globais.

    Às vésperas da posse de Trump, a União Europeia disparou sinais ao futuro governo, exortando-o a poupar o pacto nuclear com o Irã.

    A mensagem chegava embebida por interesses econômicos e também pela percepção de que expandir contatos econômicos e diplomáticos com Teerã contribuem, no médio prazo, para fortalecer setores moderados da sociedade iraniana, enquanto, segue a lógica, isolar o regime dos aiatolás vai ao encontro dos interesses de grupos mais conservadores de Teerã, preocupados em se agarrar ao poder apoiados na pesada retórica contra os EUA e seus aliados, como Israel e Arábia Saudita.

    No recente périplo ao Oriente Médio, Trump voltou a insistir no isolamento do Irã, em discursos bem recebidos por anfitriões israelenses e sauditas. A Casa Branca, em fevereiro, impôs novas sanções a Teerã, após o governo iraniano patrocinar teste com mísseis.

    Em maio, o regime iraniano sinalizou a opção por preservar o tratado, com a recondução ao poder do presidente Hassan Rouhani, para mais um mandato de quatro anos. "A França permanecerá vigilante, para certificar-se de que Teerã continuará a observar estritamente as condições do acordo", declarou então Macron.

    Se Trump insistir em desfazer o tratado, se fortalecerá junto a aliados como os governos israelense e saudita. Mas vai deslanchar mais uma crise, por exemplo, com Alemanha e França.

    jaime spitzcovsky

    Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.

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