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    Jaime Spitzcovsky

    Slogan de propaganda de Xi Jinping revela os rumos da China

    23/10/2017 02h00

    Ao anunciar "o socialismo com características chinesas para uma nova era", o dirigente chinês Xi Jinping sinaliza entender que seu período no poder é o principal momento para reformas após a etapa capitaneada por Deng Xiaoping (1977-1997), patriarca das mudanças.

    Xi também desenha mais um slogan, na tradição milenar da China e fortalecida pelo Partido Comunista, de recorrer a expressões curtas, para indicar rumos políticos e criar ferramentas propagandísticas.

    Na ortodoxia vermelha de Mao Tse-tung (1949-1976) ou na alquimia mercadológica de Deng, o regime recorreu fartamente à propaganda (xuanchuan, em chinês) e a motes sintéticos, observados, por exemplo, na fórmula de "mobilizar apenas quatro caracteres chineses".

    Na Revolução Cultural (1966-76), anos de radicalização do maoísmo, o governo impunha ondas de terror ao brandir slogans como "esmagar quatro coisas velhas", referência genérica a "ideias, cultura, costumes e hábitos" condenados pelo regime.

    Deng Xiaoping, no poder, esvaziou o maoísmo, reformou a abordagem ideológica e, para colocar a China em rumo distinto, cunhou a expressão "socialismo com características chinesas", rótulo da manutenção do monopólio do poder do Partido Comunista com as injeções cavalares de capitalismo na esfera econômica.

    Sucessores de Deng seguiram a cartilha partidária e desenharam slogans. Jiang Zemin (1989-2002) sustentava a "teoria das três representações", responsável por mudança cardinal nos manuais do partido. Empresários, engrenagem relevante para a decolagem econômica, deixaram de ser descritos como "exploradores do proletariado" e passaram a integrar "as forças produtivas da sociedade chinesa".

    Jiang Zemin, cultivando a incipiente e próspera iniciativa privada, deixou para o sucessor, Hu Jintao, crescente desigualdade na distribuição de renda, apesar de avanços no combate à pobreza. Tensões sociais levaram Hu Jintao a eleger a "construção de uma sociedade harmoniosa" como slogan de estimação.

    Em política externa, Hu Jintao (2002-2012) cravou a expressão "ascensão pacífica", resposta às alarmistas teorias da "ameaça chinesa", apoiadas na tese da inviabilidade de diálogo de Pequim, por exemplo, com Washington.

    Xi Jinping recebeu o cetro de Hu Jintao, cinco anos atrás, e desenhou como slogan inicial "o sonho chinês", alusão ao "american dream". No primeiro mandato, porém, Xi priorizou consolidar seu poder, ao afastar adversários e apertar a repressão.

    O mandarim, nomeado o homem mais poderoso do mundo pela revista britânica "The Economist", discursou semana passada no Congresso do Partido Comunista e prometeu uma China assertiva no cenário global, mas comprometida com "a cooperação internacional e integração econômica".

    Comparou seu segundo mandato a uma renovação da trajetória de Deng. Falou em nova era para o "socialismo com características chinesas", baseada em inovação e consumo doméstico. Apegado às tradições, Xi Jinping abusou de slogans.

    Só não explicou como, no médio e longo prazo, conseguirá manter a mão pesada do Partido Comunista sobre uma sociedade civil cada vez mais complexa.

    jaime spitzcovsky

    Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.

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