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    Jaime Spitzcovsky

    Sadat e os sauditas, 40 anos depois

    20/11/2017 02h00

    Reuters
    O presidente do Egito, Anuar Sadat: Late Egyptian President Anwar Sadat, deep in contemplation, smokes his pipe. In what was probably the biggest gamble of his career, Sadat flew to Israel on November 19, 1977 to tell its leaders he wanted peace. Picture taken Nov 1977. [B/W only] an/Ho REUTERS*** NÃO UTILIZAR SEM ANTES CHECAR CRÉDITO E LEGENDA***
    O ex-presidente do Egito Anuar Sadat

    Após 40 anos, príncipe saudita pode repetir iniciativa de paz de Sadat

    Há exatos quarenta anos, em 20 de novembro de 1977, o presidente egípcio, Anuar Sadat, protagonizou cena histórica. Discursou no Knesset (Parlamento israelense), reconheceu Israel e levou o Egito, no ano seguinte, à condição de o primeiro país árabe a assinar um acordo de paz com o Estado judeu.

    "Já anunciei em mais de uma ocasião que Israel se tornou um fait accompli, reconhecido pelo mundo", declarou Sadat. "Como nós realmente e verdadeiramente buscamos a paz, nós realmente e verdadeiramente lhes damos as boas-vindas, para viver entre nós em paz e segurança", prosseguiu. Na plateia israelense, deputados, militares e o primeiro-ministro, Menachem Beguin, do Likud (direita).

    Sadat, em anos tensos da bipolaridade EUA-URSS, gerou sismos geopolíticos. Após a derrota na Guerra do Yom Kipur, em 1973, abandonou aliança com Moscou e o chamado "campo anti-imperialista" para se aproximar de Washington e de Israel, de olho em vantagens estratégicas, como afastar o fantasma de conflitos armados, e em ajuda financeira da Casa Branca, até hoje a engordar a máquina militar egípcia.

    À época, Sadat fez análise correta dos rumos da Guerra Fria e compreendeu a dianteira norte-americana. Ganhou o Nobel da Paz, com Beguin, em 1978. Mas, no mundo árabe, enfrentou isolamento diplomático, desfeito apenas em meados da década seguinte. E, em 1981, um ataque terrorista perpetrado por fundamentalistas egípcios matou Sadat.

    Desde então, o Egito mantém o tratado de paz com o país vizinho, embora sejam tíbios os laços construídos com israelenses, em quatro décadas, nos campos econômico e social. E coube à Jordânia, em 1994, tornar-se o segundo país árabe a reconhecer Israel.

    As iniciativas egípcia e jordaniana contribuíram para empanar a resolução de Cartum, aprovada em reunião da Liga Árabe, em 1967, e conhecida como a "decisão dos três nãos: não à paz com Israel, não ao reconhecimento de Israel, não a negociações com Israel".

    No entanto, quarenta anos depois, o regime teocrático do Irã e seus aliados, como o libanês Hezbolá e o palestino Hamas (que hoje também negocia com o Egito), ainda alimentam o rejeicionismo, sabotando condições para um amplo diálogo regional e fortalecendo, em Israel, o discurso de partidos refratários a negociações na questão israel-palestina.

    O rejeicionismo, porém, parece prestes a levar mais um golpe. Embalada pela rivalidade regional com o Irã, a Arábia Saudita se aproxima de Israel, em movimento acelerado após a chegada de Donald Trump à Casa Branca. O presidente norte-americano se gaba dos vínculos políticos e econômicos cultivados com israelenses e sauditas.

    O príncipe-herdeiro Mohammed bin Salman, em terras sauditas, anuncia reformas, acumula poder e sinaliza disposição para apostar num eventual acordo de paz com Israel. Se a ousada estratégia resultar em segurança para israelenses e em soberania para palestinos, será a conquista de um cenário há muito tempo desejado. E que pode acontecer, apesar de todo o ceticismo acumulado ao longo do tempo.

    jaime spitzcovsky

    Jornalista, foi correspondente da Folha em Moscou e em Pequim. Na coluna, fala sobre relações internacionais, com atenção especial ao Oriente Médio. Escreve às segundas, a cada duas semanas.

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