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    Janio de Freitas

    Ao vencedor, adeus

    11/01/2015 02h00

    Bom para muitos, não para Dilma Rousseff. Ótimo para um, péssimo para vários. Assim é este número sem charme: 6,41.

    No primeiro dia útil da semana, Guido Mantega deixou o governo com a discrição dos vencidos, desenhado por muitos dos economistas e por quase todo o jornalismo de economia como incompetente para as atuais circunstâncias, em grande parte atribuídas ao que seriam seus erros.

    No último dia útil da semana, o divulgado índice da inflação em 2014, de 6,41%, demonstrou: quem estava certo era Guido Mantega. Até muito perto do fim do ano, sua insistência em que a inflação ficaria abaixo do "teto" de 6,5%, fixado para o ano foi contestada ou posta em dúvida crítica. Com isso, o alegado "descontrole inflacionário" passou de tema econômico a tema político, gerando um clima de desalento que justificou o retorno dos juros à escala antissocial, contrária ao crescimento econômico e prejudicial à distribuição de renda. Tudo isso para quê? Ou, melhor, para quem?

    Com a inflação dentro da faixa aceita no início daquele ano como conveniente, Dilma Rousseff vê neutralizar-se uma carga opositora que a enfraqueceria e favoreceria Joaquim Levy, nos casos, bastante prováveis, de divergência entre a presidente e o ministro.

    Mas a inflação "dentro da meta" é um comprovante a mais, agora de teor econômico, da precipitação com que Dilma Rousseff adotou as teses e os métodos do (neo)liberalismo conservador. Uma afirmação absurda de que, entre os adeptos do crescimento econômico como prioridade e desenvolvimento social como obrigação humana, não são encontráveis gestores e métodos capazes de bem conduzir a economia.

    Guido Mantega foi espremido. Não teve o reconhecimento da parte que lhe coube no êxito econômico do segundo mandato de Lula, nem lhe foi concedida a ressalva, no governo Dilma, de que conteve fora as ondas piores da crise internacional. Para negá-lo, os comentaristas neoliberais comparam o Brasil com o crescimento de alguns vizinhos, fazendo por esquecer que a agressividade da crise é menor com economias menos desenvolvidas, ou menos complexas. França, Itália, Espanha, Rússia, China, a fortaleza alemã, além de outros, não escaparam aos efeitos nocivos.

    DIFERENÇAS

    Há um lado positivo no aparecimento de Antonio Anastasia entre os citados pelo ex-entregador de dinheiro ilegal a mando de Alberto Youssef. Não pela pessoa de Anastasia. Condutor da parte administrativa dos governos mineiros de Aécio Neves, enquanto Andrea Neves controlava a parte política e publicitária, Anastasia se tornou sucessor natural do chefe. Seria o ministro da Casa Civil se Aécio derrotasse Dilma, e elegeu-se senador. Sempre pelo PSDB.

    A inclusão de Anastasia na Lava Jato fez a imprensa e a TV afinal pensarem um pouco na inconveniência de encampar e amplificar denúncias feitas por gente desqualificada e sem prova, sem sequer indício. E, na Lava Jato, sem que haja notícia das indispensáveis investigações para comprovar ou desmentir o delator premiado. Os vazamentos têm bastado para a imprensa e a TV.

    Mas Anastasia e a concomitante acusação ao deputado peemedebista Eduardo Cunha já tiveram tratamento diferente. É o efeito tucano.

    OS ESPECIALISTAS

    Evidências do quanto estavam bem treinados os terroristas na França, como está propalado.

    Foram em três prédios à procura da Redação do "Charlie Hebdo". Não sabiam em que andar ficava. Perguntaram na portaria e, com aquela indumentária, foram mandados para o terceiro andar. Subiram e voltaram. No segundo, correto, não tinham como entrar na Redação: ignoravam o sistema eletrônico de abertura. Forçaram uma pessoa da portaria, que tinha o cartão magnético.

    Estavam tão cientes de que os pormenores fazem o êxito ou o insucesso de operações assim que, como se fossem eles os humoristas, portavam suas carteiras de identidade e deixaram uma no carro de fuga. Sem ter, aliás, um plano de fuga e desaparecimento imediato: ficaram rodando mais de 24 horas em carros roubados.

    Obtusidade igual, só a da polícia e das autoridades francesas: decidiram matar os três, e ficaram sem ter quem dê informações diretas sobre o que pode haver por trás do ataque e dos caros fuzis AK-47.

    janio de freitas

    Colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa as questões políticas e econômicas. Escreve aos domingos e quintas-feiras.

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