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    Janio de Freitas

    Reino do 'nonsense'

    05/02/2015 02h00

    Se a Petrobras ainda estivesse sob a ação ignorada e tranquila de gatunos, a realidade dos últimos 11 meses seria assim: suas ações em altas cotações na Bolsa, bafejadas pelo crescimento da produção a despeito da queda de preço do petróleo, os corruptos embolsando seus ganhos com a segurança de sempre, e bancos e corretoras festejando em vez de derrubar os dirigentes da empresa. Ou seja, toda a desgraça lançada sobre a Petrobras decorre de que a gatunagem foi constatada, abriram-se inquéritos com numerosas prisões de corruptores e corrompidos.

    Era possível, anteontem, ouvir a notícia da reunião de Dilma Rousseff e Graça Foster, para o afastamento da presidente da Petrobras, e logo a notícia de que "a Petrobras bateu o recorde de produção em dezembro". Que associação se poderia fazer entre os dois fatos tão íntimos entre si, a não ser sua naturalidade brasileira?

    Pior para quem ouviu tais notícias e no mesmo dia leu, do autor pago de um parecer favorável a impeachment de Dilma, que a "insistência, no seu primeiro e segundo mandatos, em manter a mesma diretoria que levou à destruição da Petrobras" caracterizou improbidade. Essa Petrobras "levada à destruição" conseguiu em 2014, portanto quando os diretores a destruíam, o recorde da produção de derivados com 2,17 milhões de barris de petróleo por dia. O sexto recorde anual seguido, sendo este último, deduz-se, de produção fantasmagórica.

    A "insistência" de Dilma, "no seu primeiro e segundo mandatos", em "manter a mesma diretoria que levou à destruição da Petrobras" contém importante revelação: a empresa tinha duas diretorias paralelas. Uma, presidida por Graça Foster, substituiu a existente no governo Lula. A outra, imperceptível a olhos comuns como os nossos, mas captada pela visão de pareceristas bem-aventurados e ficcionistas consagrados.

    Neste último caso se encontrou a também novidadeira informação, por um dos nossos cronistas, de que "o maior acontecimento" do governo Dilma "foi o rombo criminoso da Petrobras". Não creio (bem, só porque não sou homem de fé) haver alguma ponta de intenção na constante falta de clareza, quando citada uma gatunagem, sobre o período em que se deu. Nem por isso se fica impedido de ver que o maior acontecimento do governo Dilma deu-se no governo Lula. À primeira vista, só um escorregão crônico, mas que põe Graça Foster, uma pessoa a ser respeitada, sob a acusação de presidir "o rombo criminoso da Petrobras".

    Não se sabia que o petróleo torna as pessoas sentimentais. Mas ontem se teve a notícia de que a Petrobras recebeu o OTC-2015, o Distinguished Achievement Award for Companies, Organizations and Institutions, "o mais importante para operadoras off-shore". O prêmio foi em reconhecimento ao "conjunto de tecnologias desenvolvidas para a produção na camada pré-sal". Mas, percebe-se, foi só por nostalgia, para uma empresa que deixou de existir, para a destruída Petrobras.

    janio de freitas

    Colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa as questões políticas e econômicas. Escreve aos domingos e quintas-feiras.

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