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    João Manoel Pinho de Mello

    Teto dos gastos é boa ideia, apesar de previsões de dano a programas sociais

    30/09/2016 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 31-08-2016, 17h00: Os ministros Henrique Meirelles (Fazenda) e Dyogo Oliveira (Planejamento) durante coletiva de imprensa para falar sobre o orçamento para 2017, no Palácio do Planalto. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
    O ministro da Fazenda Henrique Meirelles durante coletiva de imprensa no Palácio do Planalto

    Este ano o deficit do governo será 10% do PIB. Ou controla-se o gasto. Ou impostos sobem. Ou ambos. As alternativas são calote e inflação.

    Parte da estratégia do governo é limitar o gasto público por lei.

    A Proposta de Emenda Constitucional 241, PEC do teto dos gastos, restringe o aumento do gasto primário –aquele que não conta os juros– à inflação do ano anterior. É uma camisa de força.

    No passado recente caímos, de novo, no canto da sereia do moto-contínuo. "Se gastar, o crescimento virá". Veio, mas foi o espetáculo do desemprego. Agora precisamos nos amarrar no mastro.

    Que Dilma e seu grupo afundaram o barco poucos discordam. Mas como poucas pessoas conseguiram fazer tanto dano? E as travas institucionais? E as restrições informais, como a competição política e o mercado financeiro?

    A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) foi insuficiente. Enquanto a sereia cantava, a LRF virava uma chacota ciclista. O mercado financeiro identificou a chacota no começo de 2013. Levou dois anos para disciplinar o governo. As agências de risco tirariam o grau de investimento somente em setembro de 2015. Credores e agências de risco nem sempre têm apetite para punir devedores oportunistas.

    O cidadão tem dificuldade de punir as malandragens contábeis do governo. O tema pedaladas é intrincado até para especialistas.

    O eleitor reelegeu Dilma, premiando a chacota. Depois que o estelionato eleitoral se materializou em recessão e desemprego, as pesquisas de opinião e o ronco da rua puniram Dilma. Não o eleitor.

    Por isso a PEC é uma boa ideia.

    Diferentemente da LRF, ela força o governante a enfrentar a restrição orçamentária por lei. Não é de graça, claro. No mundo ideal haveria flexibilidade total para fazer política fiscal anticíclica. Seria lindo ouvir o canto da sereia sem atar os braços.

    A PEC não é panaceia. Reformar a Previdência é ainda mais importante. Por sinal, a reforma previdenciária tornará mais crível o teto.

    Há o temor de que a PEC provoque cortes na área social. A sereia virou Cassandra. Mas estou otimista.

    Devem-se preservar os programas sociais para não castigar quem mais precisa. Há muito gasto ineficiente e injusto para cortar antes. Exemplos: subsidiar campeões nacionais; recurso para empreiteira fazer estrada com os camaradas do MPLA em Angola; desonerações atabalhoadas para o setor industrial; salários elevados para servidores públicos.

    Enrolada na bandeira, a sereia dizia que os gastos "adensariam" as cadeias produtivas, criando e mantendo empregos de qualidade.

    A ideologia misturou-se ao oportunismo para fomentar uma atividade econômica danosa: extração de rendas criadas pelo governo. A sereia é amiga do rentista.

    Os rentistas seguramente tentarão manter seus subsídios a todo custo. Mas quem teria coragem de cortar o Bolsa Família ou o SUS? Os programas sociais são intocáveis por razões eleitorais. Ao contrário das filigranas inexpugnáveis da lei fiscal, o eleitor identificará facilmente os cortes na área social e punirá o governante. Para isso a disciplina funciona.

    A PEC explicitará a carestia. O instinto de sobrevivência dos políticos evitará cortes substanciais nas áreas sociais. Perderão os verdadeiros rentistas. Mas e os outros "rentistas", os que "vivem" dos juros altos que o governo paga? Mais da metade do deficit é juros. A PEC exclui os juros. Próximo artigo.

    joão manoel pinho de mello

    Escreveu até março de 2017

    Economista trata de temas menos frequentes no debate econômico, como desenhos de leilões de concessão, custo da violência e causas da desigualdade.

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