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    João Manoel Pinho de Mello

    PEC do Teto já é um sucesso por seu caráter pedagógico

    14/10/2016 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 10-10-2016, 21h00: Deputados da base do governo Temer e o relator da PEC 241, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), comemoram a aprovação da PEC do Teto de Gastos. O presidente da câmara dep. Rodrigo Maia (DEM-RJ) comanda a sessão. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
    Deputados da base do governo Temer e o relator comemoram a aprovação da PEC do Teto

    Aprovada em primeiro turno na Câmara há quatro dias, a PEC do Teto dos gastos já é um sucesso pedagógico. A reação à PEC lembra o ditado: farinha pouca, meu pirão primeiro. A Procuradoria-Geral da República questionou a constitucionalidade da PEC. Entre outras coisas, a PEC comprometeria o combate à corrupção. Infere-se que o combate à corrupção dependa da manutenção ou do aumento dos gastos do Ministério Público, incluindo aí os salários.

    A gritaria não surpreende. O teto escancara a carestia. Os altos salários de parte do funcionalismo podem ficar insustentáveis politicamente. Pesquisas científicas de Sergio Firpo e coautores mostram que há um prêmio de salário no funcionalismo. O servidor público ganha mais do que o empregado privado com os mesmos atributos, como escolaridade e experiência. Pior, a diferença aumentou nos últimos anos.

    É difícil entender os modelos econométricos. O caso do Ministério Público é ilustrativo. O salário dos procuradores da República, depois de descontar o Imposto de Renda, é de R$ 22,6 mil por mês, em média. Isso dá quase 26 salários mínimos. Sem contar benefícios que outros trabalhadores normalmente não têm, como adicionais por tempo de serviço e por ocupar cargos comissionados. O maior salário equivale a quase 28 salários mínimos.

    Nos EUA, o "attorney general" –equivalente ao procurador-geral– ganha 11 salários mínimos. Os outros procuradores ganham menos.

    Há muitos advogados nos Estados Unidos, o que diminui seus salários. A desigualdade de renda é menor nos EUA. E na América Latina, onde a desigualdade é alta? No Chile, o alto escalão do Ministério Público ganha 17 salários mínimos, em média. Na Colômbia e Peru, os salários mais altos do Ministério Público são de 19 e 17 salários mínimos, respectivamente. E não é porque o salário mínimo seria baixo no Brasil. A conclusão é parecida se calculássemos quantos PIBs per capita os salários valem no Brasil e nesses países.

    salário de procurador - Relação entre salário do funcionalismo e salário mínimo em países da América

    O principal mérito da PEC é ajudar a controlar o gasto para podermos pagar as contas. Ela preservará os gastos sociais no primeiro momento, para poder aumentá-los quando a casa estiver em ordem. Junto com outras medidas, o teto trará o ajuste fiscal necessário em nove anos, quando a regra de crescimento real zero da despesa primária poderá ser revista.

    O mérito pedagógico não deve ser menosprezado. O teto faz um gasto competir diretamente com o outro. Para aumentar recursos para saúde e educação além do mínimo constitucional, é preciso reduzir subsídios e controlar aumentos salariais de servidores públicos. Teremos que encarar a reforma da Previdência. Caso contrário, o teto não será cumprido depois de alguns anos.

    Controlar os salários de parte do funcionalismo resolve o problema? Não, mas ajuda. "Um bilhão aqui, outro ali, e logo você falará sobre dinheiro sério," teria dito um senador estadunidense.

    Quem paga as aposentadorias precoces e com reposição salarial alta? Quem paga os salários do alto escalão do funcionalismo? Até agora, a conta caía no colo de seres abstratos, habitantes dos modelos dos economistas. Por exemplo, as gerações futuras, por meio de endividamento. Ou os detentores de moeda, via inflação, ou seja, os mais pobres (os ricos têm títulos públicos protegidos contra a inflação, ainda que imperfeitamente). Ou o contribuinte, talvez o ente mais etéreo.

    O teto explicita que a educação e a saúde pagam os altos salários e a aposentadoria precoce. Já é um sucesso pedagógico.

    joão manoel pinho de mello

    Escreveu até março de 2017

    Economista trata de temas menos frequentes no debate econômico, como desenhos de leilões de concessão, custo da violência e causas da desigualdade.

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