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    João Manoel Pinho de Mello

    A Previdência não cabe na nova realidade demográfica

    20/01/2017 02h00

    Fábio Rodrigues Pozzebom/ABr
    Pensionistas e aposentados do INSS buscam benefício do 13º salário
    Pensionistas e aposentados em agência do INSS

    Os principais objetivos de um sistema previdenciário são suavizar o consumo, isto é, evitar uma queda abrupta da renda na aposentadoria, e combater a pobreza.

    O sistema brasileiro atinge com folga o objetivo de evitar a queda acentuada da renda. No jargão, a taxa de reposição é alta no Brasil. Em média, o brasileiro se aposenta com 80% do último salário, fração maior do que na maioria dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), um clube de economias ricas.

    Os esquemas de aposentadoria desatrelados à contribuição possivelmente ajudam a combater a pobreza (é preciso avaliar melhor seus efeitos). A Previdência Social Rural –que atende trabalhadores rurais com pouca capacidade de contribuir– e o Benefício de Prestação Continuada –que atende idosos e deficientes pobres– custam 2,1% do PIB.

    O Bolsa Família custa 0,6%. Tendo ou não contribuído, 80% dos brasileiros com mais de 64 anos recebem alguma forma de aposentadoria ou pensão, uma das frações mais altas da América Latina.

    O sistema é generoso. Gastamos 10% do PIB com Previdência (setores privado e público), a média da OCDE. Mas a fração de idosos no Brasil ainda é menor. Além de a taxa de reposição ser alta, a idade média de aposentadoria é baixa em relação aos países da OCDE.

    Mas a média disfarça uma diferença perversa: os mais pobres tendem a se aposentar mais tarde. As pessoas de renda mais alta participam mais do mercado formal de trabalho e, por isso, se aposentam mais por tempo de contribuição.

    O brasileiro não se aposenta precocemente porque vive menos ou começa a trabalhar antes. Se chegar aos 65, a expectativa de vida é apenas sete meses menor do que a média da OCDE. O brasileiro começa a trabalhar aos 23 anos em média, assim como nos países da OCDE.

    A generosidade tem preço. Em 2015, a previdência do setor privado teve um deficit de R$ 86 bilhões, quase 1,5% do PIB. Os aposentados rurais tiveram um deficit de R$ 91 bilhões. Entre os urbanos, houve um superavit de R$ 5 bilhões.

    O setor urbano tem superavit porque há muitos trabalhando e poucos aposentados (em termos relativos). Mas o "bônus demográfico", uma geração particularmente numerosa que está no mercado de trabalho, está perto do fim.

    A geração seguinte não é tão grande, e estamos vivendo cada vez mais. Portanto, a conta do setor urbano rapidamente não fechará.

    De fato, mesmo com a demografia ainda favorável, o superavit da previdência urbana cai desde 2012 como fração do PIB. A partir de agora, a tendência é piorar se nada for feito. A aritmética da demografia é desagradável, parafraseando Sargent e Wallace.

    O Brasil tem renda média, mas um sistema de aposentadoria de país rico. E um enorme programa de transferência de renda embutido no sistema previdenciário.

    Quando tivermos a fração de aposentados dos países maduros, a conta não fechará. Na verdade, não fechará bem antes. E isso porque não se tratou da aposentadoria do setor público, em que o deficit por aposentado é maior, mas o rombo total é menor.

    A Previdência não cabe na nova realidade demográfica: vive-se mais e haverá cada vez idosos. É preciso reformar a Previdência para que ela siga cumprindo os papéis de suavização da renda e de redução da pobreza.

    Por isso a necessidade reformas, com fixar idade mínima onde não há e barrar aposentadorias antecipadas, entre outras.

    joão manoel pinho de mello

    Escreveu até março de 2017

    Economista trata de temas menos frequentes no debate econômico, como desenhos de leilões de concessão, custo da violência e causas da desigualdade.

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