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    João Manoel Pinho de Mello

    Empresários não precisam de muleta, mas de condições para fazer negócios

    17/02/2017 02h00

    Eduardo Anizelli - 26.mar.10/Folhapress
    LONDRINA, PR, BRASIL, 26-03-2010, 08h40: Funcionarios trabalham em linha de producao do fio da seda na industria Bratac, em Londrina, PR. A concorrencia com a China fez com que a industria da seda no Brasil sofresse uma leve queda. (Foto: Eduardo Anizelli/Folha Imagem, DINHEIRO) ***EXCLUSIVO FOLHA***
    Funcionário em linha de produção em Londrina (PR)

    A política industrial é a estratégia de intervenção para fomentar setores que, na ausência da política, não existiriam ou ficariam atrofiados quando à sociedade interessa que existam. Política industrial corrige alguma falha de mercado.

    Acemoglu e Robinson dizem: "No mundo real, as economias são crivadas por falhas de mercado, de modo que um governo benevolente e onipotente pode intervir bastante de forma sensata".

    Fontes de energia limpa –solar, por exemplo– seriam viáveis se os consumidores pagassem todos os custos da energia suja (térmica, por exemplo). Deixado à própria sorte, o mercado entrega menos energia limpa do que a sociedade gostaria.

    A poluição é mais cara do que a diferença de custos entre as energias solar e térmica. Subsidiar a energia solar é bom negócio para a sociedade, ainda que não o seja para o produtor sem subsídio.

    Nesse nível de generalidade, a ideia é sólida. Daí a justificar a escalada dirigista são outros quinhentos.

    Metade do crédito passou a ser direcionada pelo governo para setores que julga meritórios. As justificativas eram vagas ou erradas. Entre as vagas: "Adensar a cadeia produtiva". Entre as erradas: "Obras no exterior empregam engenheiros brasileiros". Faltava engenheiro no Brasil.

    A outra metade, que toma emprestado no guichê sem ajuda, paga a conta na forma de juro mais alto.

    Há mais de 40 regimes tributários especiais para setores "estratégicos". Não faltou isenção tributária para estimular o investimento. Qual a falha de mercado em cada caso?
    Os sem-isenção, na fila do ponto de ônibus e do SUS, pagam a conta.

    A escalada dirigista não corrigiu falhas de mercado. Comprometeram-se as contas do governo sem aumentar a capacidade de produção. A produtividade patinou, e a conta veio na forma de uma recessão brutal.
    Acemoglu e Robinson também dizem: "Quem já encontrou um governo benevolente e onipotente?".

    O empresariado reclama com razão. Oferecemos capital caro (para os que estão no guichê errado), legislação trabalhista engessada, sistema tributário kafkiano, burocracia e infraestrutura precária.

    Aí reparamos com isenções tributárias, empréstimos subsidiados (no guichê correto) e políticas de proteção (como conteúdo local). Para compensar a calçada esburacada, criamos uma muleta disfarçada de política industrial.

    O certo é consertar a calçada e retirar a muleta: simplificar a estrutura tributária, avançar na reforma trabalhista, reduzir o custo de fazer negócios e diminuir, para todos e de maneira sustentável, a taxa de juro (e com isso o custo de capital para o investimento). Essa é a agenda do crescimento sustentável.

    Boa notícia: já começamos. O controle da inflação permitirá a queda do juro.

    A alocação do crédito subsidiado melhorou. A nova política operacional do BNDES tem critérios claros para a concessão de empréstimos subsidiados. A fração de financiamento com juro subsidiado é mais alta para projetos de energia limpa e saneamento, cujo benefício social é claramente maior do que o privado (há falha de mercado). A fração dos projetos com empréstimo subsidiado diminuiu, e o subsídio está mais horizontal.

    A política do BNDES se aproximou das práticas de bancos de desenvolvimento como o KFW alemão. O KFW tem políticas horizontais, taxas de juros de mercado e subsídio para casos em que há falhas claras de mercado (energia renovável e mobilidade, por exemplo). Não há estímulo para o conteúdo local.

    A agenda que permite retira a muleta está em curso. Avancemos com cautela pois a calçada segue esburacada, mas avancemos. O país tem grandes empresários que não precisam de muleta, mas sim de condições adequadas para fazer negócio.

    joão manoel pinho de mello

    Escreveu até março de 2017

    Economista trata de temas menos frequentes no debate econômico, como desenhos de leilões de concessão, custo da violência e causas da desigualdade.

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