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    João Pereira Coutinho

    A verdade sobre as mulheres

    23/03/2015 10h25

    Uma amiga psiquiatra contava-me há tempos que os problemas com a imagem já não eram um exclusivo de anorécticas e bulímicas.

    Agora, apareciam no consultório adolescentes ou mulheres na casa dos 20, às vezes 30, que sofriam horrores com um problema mais sério: a celulite.

    Todos os dias, várias vezes por dia, as donzelas contemplavam-se ao espelho com obsessão psicótica. E controlavam os avanços da adiposidade como um general observa os avanços do inimigo.

    Algumas, de espírito mais científico, tiravam fotos no celular e depois comparavam os seus álbuns. Só para avaliarem a progressão da "doença".

    Escutei tudo com uma mistura de divertimento e piedade. Mas pasmei com a pergunta final da minha amiga: "Você conhece algum homem que se importe mesmo com a celulite das mulheres?"

    A resposta deveria ser tão óbvia que a pergunta só por brincadeira: nenhum homem heterossexual (manter o adjectivo, por favor) tem a celulite feminina no topo da lista.

    Vou ainda mais longe: nunca conheci nenhuma mulher saudável que não tivesse alguma celulite para mostrar. Ou, melhor dizendo, alguma celulite para me mostrar. Porque, honestamente, essas imperfeições passam-me ao lado.

    Mas a tese não é apenas autobiográfica. Com verdadeiro espírito policial, consultei amigos para auscultar sensibilidades. Não encontrei um só - palavra: nem um - para quem a celulite feminina "normal" fosse o problema que as mulheres imaginam. E quem diz celulite, diz os fantasmas todos que habitam e arruinam a cabeça feminina.

    Por isso é de saudar a proposta de Aric Sigman, um psicólogo inglês que, segundo o "Sunday Times", defende a importância dos testemunhos masculinos nas escolas para que as adolescentes escutem algumas verdades sobre matérias corporais. Já não era sem tempo.

    Uma coisa é ter como modelos de beleza moças esqueléticas, subnutridas e "masculinizadas" por criadores ou estilistas que manifestamente não gostam de mulheres.

    Outra, bem diferente, é descer à realidade e escutar os pensamentos honestos que os homens comuns têm sobre o assunto. E que se resumem em poucas linhas: as curvas são importantes; alguma gordurinha nunca fez mal a ninguém; magreza excessiva é magreza repulsiva; e uma mulher que se parece com um rapaz de saltos altos não desperta nenhum tipo de curiosidade hormonal.

    Claro que, nesta experiência, podem surgir surpresas: homens demasiado exigentes que se horrorizam com a celulite e só admitem mulheres com pesos etíopes.

    Perante esses casos, não há que deprimir. Basta que as moças escutem o infeliz e, depois, perguntem apenas quando será que ele sai definitivamente do armário.

    joão pereira coutinho

    Escritor português, é doutor em ciência política.
    Escreve às terças e às sextas.

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