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    João Pereira Coutinho

    Onde está a 'maioria silenciosa' que deseja um casamento com Madri?

    22/12/2017 17h14

    Pobre Mariano Rajoy. Quando ele aplicou o artigo 155 da constituição espanhola, o objetivo era duplo: suspender a autonomia da Catalunha e obrigar a "maioria silenciosa" dos unionistas a votar maciçamente contra os independentistas em novas eleições.

    Não aconteceu. Olhamos para os resultados do pleito catalão e Rajoy perdeu com estrondo.

    Para começar, o seu Partido Popular (PP) desapareceu da paisagem: em 2015, conseguiu eleger 11 deputados; em 2017, ficou pelos 3.

    Por outro lado, onde está essa "maioria silenciosa" que deseja um casamento eterno com Madri? Não está. A maioria ruidosa continua a batalhar pela independência —em votos e número de assentos.

    Por último, a direita espanhola deixou de ser um monopólio do PP. A partir de agora, o Cidadãos, que venceu na Catalunha em grande parte pelo talento e pela força da deputada Inés Arrimadas, tem todas as condições para crescer no país e ameaçar os conservadores.

    E agora?

    Olhando para os números, é fácil encontrar vencedores. O Cidadãos venceu porque ficou em primeiro. O bloco independentista também venceu porque chegou à maioria absoluta.

    Mas, honestamente, que vitórias são essas? De que vale ficar em primeiro quando não há condições mínimas para formar governo? E de que vale ter uma maioria absoluta a favor da independência quando nem todos os independentistas são iguais nos seus métodos de luta?

    Sim, o Juntos pela Catalunha e a Esquerda Republicana da Catalunha já perceberam as consequências do independentismo unilateral: portas fechadas na União Europeia e mais de 3.000 empresas a fugir da região.

    Mas a extrema-esquerda da Candidatura de Unidade Popular, que detém a chave da maioria, não aprendeu nada nem esqueceu nada. Independência, já!

    Para complicar as contas, será preciso lembrar que os dois principais líderes independentistas estão na prisão (Oriol Junqueras) ou no exílio (Carles Puigdemont )? E que se Puigdemont voltar a Espanha o seu destino é fazer companhia a Junqueras pelos crimes de sedição, rebelião e desvio de fundos?

    Repito o que escrevi nesta Folha dois meses atrás: a questão catalã não se resolve com a prisão dos independentistas, a ocupação policial da região e o controle do seu governo e das suas finanças por Madri.

    Quando existe uma maioria de catalães que querem ser independentes, devem criar-se as condições constitucionais para que a autodeterminação seja, pelo menos, uma hipótese real e legal —e não um tabu político.

    joão pereira coutinho

    Escritor português, é doutor em ciência política.
    Escreve às terças e às sextas.

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