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    Josimar Melo

    Sabores da Bahia

    06/08/2015 02h00

    Escrevo esta coluna no caminho de volta entre a península de Maraú, na Bahia, e minha casa em São Paulo. Foram perto de 12 horas de jornada. Não que o lugar seja tão longe –fica a 130 quilômetros ao norte de Ilhéus, mais ou menos a meio caminho entre esta cidade e Salvador.

    Mesmo com o afluxo crescente de turistas, a demora se dá pelas dificuldades de acesso que ainda persistem, como quando estive lá dez anos atrás.

    A parte mais fácil é tomar um avião de São Paulo até Ilhéus (com os percalços habituais –trânsito, chegar cedo ao aeroporto etc.). Mas feita essa primeira parte, é preciso ir de carro do aeroporto até a cidade de Camamu (a melhor opção; há outros caminhos ainda mais demorados). São duas horas de estrada, ao fim das quais se toma um barco para atravessar a baía formada pela península.

    Entre o trecho pelo rio Orojo até Barra Grande ou até o píer de Taipu de Dentro, lá se vai mais meia hora. E se o seu ponto final, como o meu, for a praia do outro lado, no mar aberto, coloque mais meia hora de estrada de terra.

    Meu destino era a praia (e a pousada homônima) de Taipu de Fora. Em frente ao mar, ela é ladeada por quilômetros de belas praias e coqueiros curvados pelo vento intenso. Sem falar de arrecifes, que formam piscinas naturais, ou das refrescantes lagoas de água doce próximas ao mar.

    Fui ali convidado para o Primeiro Festival de Arte e Gastronomia de Taipu de Fora, promovido no último fim de semana pela pousada. Uma simpática iniciativa que reuniu escritores, artistas plásticos, músicos, chefs, participantes de mesas-redondas ao longo dos quatro dias de evento.

    No tocante à gastronomia, sobre cuja atividade me atenho, a decisão dos festival foi a de fazer refeições temáticas, desde pratos tradicionais da chamada Costa do Dendê até temas como "Bahia Francesa". E todos os chefs seriam somente da península de Maraú.

    Uma decisão ousada, mas de resultados discutíveis. Nos painéis de literatura havia convidados de vários Estados; mas, nos almoços e jantares, apenas chefs locais, com grandes desafios como realizar fusões de comida baiana e italiana, por exemplo.

    O resultado foi aquém do que seria se também na gastronomia tivessem sido chamados chefs de fora, de prestígio e experiência, como há tantos pelo Brasil.

    Pode parecer uma visão colonialista da minha parte, mas estou certo de que, para os próprios profissionais da região, seria muito enriquecedor acompanhar o processo criativo de chefs experientes trabalhando, ali, a fusão de seus conhecimentos com as lagostas, camarões, lambretas do local.

    Foi bonito, de toda forma, ver o esforço e envolvimento do chef da pousada, Gino Cesar, como anfitrião de seus colegas de restaurantes e pousadas locais.

    Mas, depois de quatro dias provando diversos pratos com tão diferentes propostas, o que não dá para tirar da cabeça (e da memória do palato) deste cronista são as tradições locais.

    Representadas pela moqueca de lagosta (ainda que pudesse ser mais caudalosa), pela tapioca recheada do café da manhã, e especialmente pela deliciosa carne de sol acebolada com pirão de leite. Isso sim, como ficou demonstrado pelo trabalho do chef local, não precisa chamar ninguém de fora para fazer.

    josimar melo

    Josimar Melo é crítico gastronômico, autor do 'Guia Josimar' de restaurantes, bares e serviços de SP. Escreve às quintas, a cada duas semanas.

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