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    Josimar Melo

    Oriente com cara de Paris

    15/10/2015 02h00

    No meio de uma viagem que me levara de Londres ao sul da França, em junho, fui convidado a conhecer o novíssimo hotel do grupo oriental Peninsula em Paris. Fiquei curioso por verificar como o espírito asiático se mesclaria com a tradição de uma cidade conhecida por seus "hotéis-palácio" de alto luxo.

    A surpresa foi constatar que o hotel, pelo contrário, não tinha a menor cara do Oriente, salvo discretíssimas indicações. O intuito da rede, compreendi então, é outro: absorver o espírito da cidade onde se instala, mimetizando-se como um local.

    Para quem tem muito dinheiro (diárias começando em torno de € 1.350) e curiosidade de ver como funciona uma hotelaria de altíssimo padrão, é no mínimo instrutiva a visita a este Peninsula –rede nascida em Hong Kong em 1928, com apenas dez hotéis hoje e uma das poucas ainda em mãos da família fundadora.

    Ele foi instalado, claro, na rica margem direita do Sena, com vista para o arco do Triunfo e para a torre Eiffel. Fica em frente à estação de metrô Kléber, que eu adoro (quando, como turista pobre, saio para ir ao lado esquerdo do rio, por esta linha se tem a surpresa de, subitamente, ver o trem sair do subsolo e ganhar a superfície desfraldando a visão da torre Eiffel).

    Fica num palácio do século 19 cheio de história: ele já foi muita coisa, inclusive um hotel (o Majestic, a partir de 1908), prédio de governo, QG dos nazistas durante a ocupação alemã e um centro de conferências onde foram assinados, em 1973, os acordos de Paris, que selaram a derrota americana na guerra do Vietnã.

    No preciso local onde esses (e outros) acordos foram assinados funciona hoje o bar do hotel, o Kléber, onde é indispensável beber um dry martini de olhos fechados, sentindo o bafejar da história.

    É o recanto do hotel onde mais o passado está presente na decoração. Pois no resto do imenso palácio, a meticulosa restauração foi também discretamente modernizada, com uma contida elegância.

    Quartos grandes (coisa rara em Paris), dotados de controles digitais que criam uma atmosfera curiosamente hi-tech, restaurante no alto com vista panorâmica (o L'Oiseau Bleu, agradavelmente informal –e com permissão para fumar nas mesas do terraço), além de um bom restaurante chinês, aí sim com decoração oriental: indícios de uma grande hotelaria.

    Ela está também nos detalhes. Por exemplo, deixe seus óculos sobre a mesa do quarto quando sai para jantar, e na volta eles estarão envoltos num lencinho de limpar lentes.

    A discrição, parte de qualquer grande hotelaria, também aqui foi posta à prova, por acaso. Um dia me deparei com uma multidão na entrada. Perguntei na recepção e soube que era um hóspede que chegaria –e que tinha divulgado o fato nas redes sociais. Mas não disseram de jeito nenhum quem era.

    Perguntei na rua para um fã, que no seu melhor francês respondeu: é Marriá Carrê.??? Depois entendi que era uma americana, Mariah Carey, cantora que, me disseram, estava meio por baixo, precisando usar o Twitter para ser "surpreendida" pela multidão em sua trôpega chegada –quem quiser dar risada, e tiver tempo a perder, pode ver aqui: tinyurl.com/marriacarre. (Na boa, me senti melhor quando, anos atrás, na mesma Paris, tive que dividir um elevador apertado, no hotel George 5, com um magrelo chamado Mick Jagger.)

    josimar melo

    Josimar Melo é crítico gastronômico, autor do 'Guia Josimar' de restaurantes, bares e serviços de SP. Escreve às quintas, a cada duas semanas.

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