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    Josimar Melo

    No meio do caminho

    31/03/2016 02h00

    Uma das coisas mais gostosas de encontrar em viagens, e muito comum em países com forte tradição gastronômica, são os restaurantes, dos mais simples aos mais sofisticados, na beira das estradas.

    Todos os países têm suas grandes cidades e, dentro delas, seus bairros mais gourmets ou mais boêmios, onde se concentra boa parte dos melhores restaurantes e bares.

    Mas no Brasil não existe muito o hábito de se pegar um carro e sair da cidade grande para comer pelo caminho, pois essa dispersão de bons restaurantes não é comum.

    Existem, sim, destinos turísticos com restaurantes acima da média –em São Paulo há casas de cozinha sofisticada no litoral norte, enquanto no Rio de Janeiro há até mesmo o apelido de "vale gourmet" para a região da serra fluminense, perto de Petrópolis, onde bons restaurantes se destacam.

    Mas quando se pensa num trajeto de não muitas horas, de carro, entre Paris e Lyon, atravessando a linda região da Borgonha, onde se topa, no meio do campo, com restaurantes multiestrelados a cada meia hora, dá pra entender que existe uma grande distância entre lá e cá.

    Multiestrelados? Sim, aos montes, mas não só. Atravessando o interior da França (ou da Itália, da Espanha...) a gente tropeça também em pequenas casas familiares onde comer é uma alegria. Pequenos restaurantes, produtores de queijos, embutidos, vinhos. Basta estar vivo e em movimento que os prazeres da mesa voam ao nosso encontro como os mosquitos que se estatelam no para-brisas.

    É covardia nos comparar aos paraísos gastronômicos do Mediterrâneo, claro, mas não custa sonhar que, por nossas bandas, poderíamos também ter esses oásis gourmet como pedras no meio do caminho. Algumas sei que existem: se começarmos a falar delas, quem sabe estimulemos uma tendência.

    Lembro que ainda hoje existe o hotel sexagenário O Paturi (paturi.com.br), bucólico e com restaurante francês na via Dutra, caminho de quem vai de automóvel pelo trajeto entre São Paulo e Rio de Janeiro. (Verdade que, contam os mais velhos, no passado não era tanto o pato assado, mas a discrição para encontros com amantes proibidas o principal item buscado pelos frequentadores –o que em nada desabona sua gastronomia.)

    O mais bacana nessa parada é que se trata ao mesmo tempo de um restaurante de beira de estrada e de um hotel –é, portanto, um lugar de passagem e um destino, onde cheguei já a me hospedar.

    Há muito tempo não volto ao Paturi (já coloquei na agenda). Mas estive recentemente em outra casa de beira de estrada um pouco diferente, apenas restaurante (sem hotel), ao lado de um enorme posto de gasolina, desta vez na rodovia Castello Branco: o Rancho 53 (rancho53.com.br).

    Este realmente evoca uma viagem: é para nos fazer sentir em Portugal. Desde sua arquitetura e seus azulejos até, principalmente, por seu cardápio e carta de vinhos.

    Aberto há 18 anos, serve um bacalhau que ganhou fama e, de fato, é bom –um pouco caro, mas, considerando que uma porção por cerca de R$ 220 (e com peixe de primeira) pode servir três pessoas, não deixa de ser razoável.

    As mesas do Rancho 53 se dispõem ao redor de um mercado onde se encontram desde vinhos até panelas típicas de Portugal. Seus proprietários, donos dos gigantescos e milionários postos de gasolina, são portugueses que terminaram atuando também na área de gastronomia (são donos do Barbacoa e sócios de redes como America e Due Cuochi).

    Depois desse, estarei de olho em outros bons lugares para comer no meio da viagem.

    josimar melo

    Josimar Melo é crítico gastronômico, autor do 'Guia Josimar' de restaurantes, bares e serviços de SP. Escreve às quintas, a cada duas semanas.

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