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    Josimar Melo

    Restaurantes no litoral de SP são muito caros ou para aventureiros

    19/01/2017 02h00

    Valentina Fraiz
    Ilustração da coluna de Josimar Melo em TURISMO

    No verão, o litoral norte de São Paulo, principalmente o trecho entre Bertioga e Ubatuba, costuma ferver acima dos excessivos graus centígrados da estação. Um certo caos no tráfego, nos serviços, na infraestrutura já se tornaram habituais. Ainda assim, a beleza da natureza, na sucessão de pequenas praias ladeadas por frondosos promontórios, continua seduzindo turistas. Boa parte deles com grande poder aquisitivo, permitindo que os preços alcem alturas preocupantes.

    É esse público de posses, com ambições de qualidade que invadem também a gastronomia, que permite que, numa região com um certo ar rústico e de paisagens naturais pouco desfiguradas pela invasão de arquitetura nova-rica, os restaurantes se dividam em dois extremos: ou são lugares bem simples (mas ainda assim caros para o que oferecem), onde comem jovens aventureiros, ou são caros, chiques e pretensiosos –mas raramente de alto nível gastronômico.

    Exemplos típicos das duas pontas são o Fundo de Quintal (na Barra do Sahy), onde num calor pavoroso se come um PF de peixe frito, arroz e feijão –honesto, mas difícil de digerir se for consumido todo dia; e o Manacá, lindo e competente restaurante de bela e cara cozinha do mar, no sertão do Camburizinho.

    Faz um ano, porém, que a região ganhou um justo meio termo –o restaurante Taioba, no sertão do Camburi. Um lugar de arquitetura simples e despretensiosa, o que inclui deficiência no número de ventiladores, e uma cozinha de qualidade no conceito e na execução, tocada pelo chef Eudes Assis.

    Que cozinha é essa? É caiçara, de inspiração local, executada com a perícia de um chef que, nascido ali mesmo, conseguiu reunir com equilíbrio duas escolas: a caseira, aprendida com a mãe que ia para o fogão alimentar 14 filhos, e a da alta cozinha, absorvida em cursos como o do Cordon Bleu de Paris e em estágios e trabalho em grandes restaurantes do Brasil, o primeiro dos quais o restaurante Fasano.

    O restaurante se chama Taioba não por acaso: homenageia a planta cujas enormes e suculentas folhas são usadas como decoração em jardins, mas que para Eudes sempre foram alimento –e no restaurante viraram protagonistas de um bolinho que é incontornável aperitivo e também do arroz que acompanha o prato feito de todo dia (peixe com pirão e banana assada).

    O cardápio fixo é pequeno e tem preciosidades como a manjubinha empanada em fubá e o bolinho de peixe seco –o peixe que, na infância do chef, sua mãe secava no varal para conservar. Mas uma lousa traz as sugestões do dia, homenagem aos melhores produtos, especialmente os trazidos do mar.

    Podem ser petiscos, como espetinho de polvo e batata, pastel de camarão com alho-poró, camarão no azeite de ervas ao molho tarê, e pratos, como frutos do mar ao molho de ervas com quiabo e abóbora ou filé de sororoca ao molho de camarão à provençal.

    Fico imaginando se, no lugar de estar numa entrada para o sertão do Camburi, o Taioba estivesse no sentido oposto, debruçado sobre o mar. Como a cenografia poderia exponenciar os sabores de sua mesa. E não me digam que não existe essa espécie de sinestesia entre o paladar e o ambiente, especialmente em momentos de lazer.

    Imagino aquela comida servida com vista para o farol e encravada na praia, com pé na areia, como um La Huella em José Ignacio (Uruguai). Mas isso teria um peso. Uma localização idílica impactaria os preços e criaria uma expectativa de serviço que, por sua vez, encareceria mais a operação... e a conta.

    Não, deixa o Taioba lá. No cardápio fixo, seu prato mais caro custa R$ 48, bem menos que o item mais barato em qualquer dos restaurantes famosos da região. Melhor que assim continue.

    josimar melo

    Josimar Melo é crítico gastronômico, autor do 'Guia Josimar' de restaurantes, bares e serviços de SP. Escreve às quintas, a cada duas semanas.

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