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    O Supremo Tribunal Federal é refém de suas próprias decisões

    MÁRCIO FALCÃO
    DO 'JOTA'

    15/06/2017 02h00

    Igo Estrela/Folhapress
    Ministros durante sessão do Supremo Tribunal Federal, em Brasília (DF).
    Sessão do Supremo Tribunal Federal, em Brasília (DF)

    A delação da JBS arrastou para o centro da crise política não só o presidente Michel Temer e o senador Aécio Neves (PSDB-MG), mas também o próprio Supremo Tribunal Federal e suas decisões. O Senado aproveitou a ordem assinada por Edson Fachin para tentar evitar o cumprimento do afastamento de Aécio do exercício da atividade parlamentar, que foi determinado pelo ministro.

    A manobra envolvia um jogo de palavras e era justificada pelo fato de que foi determinado o afastamento das funções parlamentares e não a suspensão do mandato. No dia 17 de maio, ao negar o pedido da Procuradoria Geral da República para que fosse decretada a prisão do senador, Fachin estabeleceu medidas cautelares.

    O ministro recorreu ao artigo 319 do Código de Processo penal que prevê a "suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais". A medida impede o congressista, por exemplo, de votar e apresentar projetos.

    A Folha mostrou nesta semana que, por mais de 20 dias após a ordem de Fachin, o nome do tucano ainda constava no painel de votações e no site da instituição na lista de parlamentares em exercício. O salário também não havia sido cortado. O Senado argumentou que não há previsão no regimento interno e nem na Constituição para afastamento de um parlamentar, além de que a decisão de Fachin tinha lacunas.

    A decisão do ministro tem nuances diferentes da ordem do ex-ministro Teori Zavascki, quando em maio de 2016, determinou expressamente o afastamento de Eduardo Cunha do cargo de deputado federal e das funções de presidente da Câmara com o avanço das investigações da Lava Jato e diante de indícios de que o peemedebista atuava para prejudicar as apurações em andamento. Cunha estava proibido até de transitar pela Câmara. Não era o afastamento das funções, mas a suspensão do mandato.

    Fachin buscou uma saída intermediária à utilizada por Teori. A ideia era que a ordem não representasse tamanha interferência de um Poder em outro, diante da gravidade de se tirar um parlamentar do mandato, mas acabou criando uma situação incomum: sua própria decisão foi utilizada pelo Senado para justificar a burla a uma ordem judicial. Leitura diferente da Câmara, que suspendeu imediatamente o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) que também teve o afastamento determinado por Fachin na esteira da colaboração da JBS.

    No caso de Aécio, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), chegou a tentar buscar apoio no próprio STF para o não cumprimento. Ao final de uma reunião sobre obras do Rio São Francisco na terça-feira, o senador pediu uns minutos para conversar com a presidente do STF, Cármen Lúcia, sobre a questão do tucano. Numa tentativa de minimizar um desgaste, Eunício apresentou à ministra 10 pontos elaborados por sua assessoria sobre dúvidas para concretizar o afastamento.

    Na sequência, o presidente do Senado bateu à porta do gabinete do próprio Fachin. O ministro informou que não poderia tratar do caso, uma vez que a relatoria, agora, está nas mãos do colega Marco Aurélio Mello. Um dia antes do recuo do Senado, que também considerou que a resistência do afastamento poderia influenciar na análise do pedido de prisão de Aécio, Marco Aurélio alfinetou. O ministro chegou a dizer que o descumprimento de uma liminar assinada por ele em dezembro afastando Renan Calheiros (PMDB-AL) da Presidência do Senado "fez escola" e defendeu até a convocação de um suplente.

    Agora, com esclarecimentos de Eunício, o novo relator já vê um "quadro revelador do cumprimento da decisão de Fachin". Resta saber se esse entendimento prevalecerá na 1ª Turma do STF. Na terça-feira, a decisão de Fachin será avaliada pelo colegiado, que também vai julgar o recurso da PGR insistindo na prisão de Aécio.

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