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    O salário dos juízes e a letargia do Supremo

    FELIPE RECONDO
    MÁRCIO FALCÃO
    DO JOTA

    24/08/2017 07h41

    Demétrius Abrahão/Fotoarena/Folhapress
    O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente o pedido do estado de Mato Grosso de ser indenizado por demarcações supostamente ilegais de terras indígenas.
    O plenário do Supremo Tribunal Federal, em Brasília

    Uma lista de fatos datados no Supremo e no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) definitivamente não contribuem para a expectativa de saneamento da folha de pagamento dos tribunais de todo o país.

    Cinco movimentos e suas datas mostram que STF e CNJ contribuem, por ação ou inação, para que a magistratura fure o teto constitucional do funcionalismo público com regularidade.

    As declarações isoladas de alguns ministros, como Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, e decisões recentes do CNJ são insuficientes para reverter o quadro.

    1 - Em setembro de 2009, o Rio de Janeiro aprovou uma lei que prevê o pagamento de uma série de benefícios extra para magistrados do estado, como adicional de 15% para o presidente do Tribunal de Justiça e de 10% para o corregedor, de auxílio-saúde, auxílio pré-escolar, auxílio-alimentação, diferença de entrância, adicional de permanência, gratificação "pelo exercício como Juiz Dirigente de Núcleo Regional". Há oito anos, portanto, o então governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, sancionava a lei que elevou os rendimentos de magistrados do Rio a valores que superam o teto constitucional do funcionalismo público.

    2 - Em março de 2010, a Procuradoria-Geral da República contestou a constitucionalidade desta lei do Rio de Janeiro, inclusive os artigos que concedem benefícios aos magistrados. O relator da ADI 4393, ministro Ayres Britto, adotou o rito abreviado da ação para acelerar a decisão do tribunal. Contudo, o julgamento só começou em maio de 2012. E um pedido de vista do ministro Luiz Fux impede, há cinco anos, que a ação seja julgada. Enquanto isso, os juízes continuam a receber as verbas adicionais.

    3 - Há praticamente três anos, em setembro de 2014, também o ministro Luiz Fux concedeu uma liminar que garantiu a todos os juízes o recebimento de auxílio-moradia. O benefício é pago inclusive aos magistrados que moram em imóvel próprio. Dias depois da decisão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) institucionalizava o pagamento do benefício por meio de uma resolução. Fux é cobrado pelos colegas publicamente a levar a liminar a julgamento no plenário, mas não o faz. Afirma que, mesmo que sua decisão seja derrubada, a resolução do CNJ manterá o pagamento do benefício.

    4 - Em novembro do ano passado, o ministro Luís Roberto Barroso liberou para julgamento outra ação referente ao pagamento de auxílio-moradia para juízes. A decisão neste processo, na impossibilidade prática de julgar as liminares concedidas por Fux, poderia levar o Supremo a declarar ilegal o pagamento do benefício. A partir desta decisão, de acordo com integrantes do tribunal, o Supremo poderia discutir a suspensão de todas as liminares concedidas em favor do pagamento. Apesar do processo estar pronto para julgamento desde 2016, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, ainda não pautou o processo para julgamento.

    5 - A ministra Cármen Lúcia assumiu a presidência do CNJ em setembro do ano passado. Somente agora, a semanas de completar um ano no cargo, a ministra determinou a todos os tribunais do país o "envio de cópia das folhas de pagamento dos magistrados da competência de cada qual de janeiro de 2017 até o mês de agosto de 2017, especificando os valores relativos a subsídio e eventuais verbas especiais de qualquer natureza e o título sob o qual foi realizado o pagamento". Entretanto, as folhas de pagamento de todos os tribunais do país estão disponíveis para consulta pública há anos, desde que o mesmo CNJ baixou uma resolução, em 2009, determinando a publicidade dessas informações. A portaria da ministra Cármen Lúcia só inovaria se os tribunais fossem obrigados a revelar, por exemplo, quanto desembolsaram separadamente por cada um dos tantos auxílios pagos aos magistrados. Mas o texto não deixa claro se os tribunais terão de fazê-lo ou se bastará enviar ao CNJ o que já disponibilizam há anos na internet. Além disso, de acordo com integrantes do conselho, a ministra não fez qualquer menção, até o momento, de revogar a resolução que regulamentou o pagamento do auxílio-moradia.

    O quadro é este. Mesmo internamente, ministros do Supremo e integrantes do CNJ se constrangem com a falta de solução para este problema que fragiliza a imagem do Poder Judiciário junto à opinião pública. E se o Judiciário não resolve seus próprios problemas, assistiu ontem ao Tribunal de Contas da União (TCU), órgão vinculado ao Congresso Nacional, propor uma fiscalização nas contas da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.

    A proposição ainda não foi analisada pelo TCU. Seria a oportunidade para o Judiciário avançar e dizer que cabe a ele, Judiciário, resolver os próprios problemas. Mas nada indica que o fará.

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