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    Juca Kfouri

    A chance perdida

    03/02/2014 03h05

    Escrevo antes do jogo em Campinas.

    Poderia perfeitamente ter escrito depois. Tempo tinha.

    Mas o resultado de Corinthians e Ponte Preta é irrelevante.

    O Corinthians ganhou? Os covardões que invadiram o clube se convencerão de que foram eles os responsáveis, no terror, já que não no amor.

    O Corinthians não ganhou? Verá o que o espera depois de amanhã, no Pacaembu, contra o Bragantino.

    Em vez de os jogadores levarem adiante o que cogitaram no sábado, capitularam diante dos mesmos velhos e falsos argumentos dos cartolas incapazes de garantir a segurança de profissionais em seu ambiente de trabalho.

    Ora, passa pela cabeça de alguém que a FPF excluiria o Corinthians de seu esvaziado Paulistinha?

    Ou que a Globo castigaria seu campeão de audiência?

    Ou que a Caixa, cujas agências andam sendo alvos de black blocs, retaliaria seu parceiro por uma causa antiviolência com alcance muito além do futebol, quando o temor nacional é o "imagine na Copa"?

    Os jogadores alvinegros, herdeiros dos que um dia protagonizaram o espetáculo da Democracia Corinthiana, coadjuvante brilhante das "Diretas Já!", tinham todos os argumentos para dar um exemplo ao Brasil e contar com a simpatia de todas as pessoas sensatas.

    A própria Globo é testemunha disso, ao tirar suas equipes de narração e comentários de estádios inseguros.

    Como exigir que atletas façam o papel de alpiste de gavião?

    Tivessem batido o pé e honrado as chuteiras que calçam, os campeões mundiais de 2012 teriam prestado um serviço inestimável não apenas a eles, mas ao futebol e até mesmo ao país, porque teriam ido além do discurso contra a violência insana.

    Talvez conseguissem que a verdadeira "torcida que tem um time" reassumisse seu papel e expulsasse os vendilhões da arquibancada.

    Pensar que esganaram Guerrero, o autor dos gols no Mundial, e assim mesmo ele jogou é estarrecedor.

    Ainda mais depois de uma temporada, a partir do assassinato em Oruro, em que o time pouco jogou em sua casa exatamente por causa de uma minoria que todos conhecem, a começar pelo comando do clube e a continuar pelos órgãos de segurança.

    Não ter jogado ontem teria significado, no máximo, perder por W.O e assumir as consequências da atitude inédita e brava.

    Quando Sócrates, ainda em fins dos anos 70, se recusou a comemorar seus gols para protestar contra ameaças de agressão, o gesto solitário era o máximo possível.

    Hoje não. Quer outra excelente bandeira para o Bom Senso F.C.? Pois não há.

    Pena, enorme pena que o grupo corintiano tenha visto o bonde da história passar à sua frente e desperdiçado a oportunidade. Dizem que ele não passa duas vezes.

    As nações verdes e amarelas, tricolores, rubro-negras, alvinegras e as celestes agradeceriam e se encorajariam. Pena!

    juca kfouri

    Tem mais de 40 anos de profissão. É formado em ciências sociais pela USP. Escreve às segundas, quintas e domingos.

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