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    Juca Kfouri

    A tal 'Neymardependência'

    18/06/2015 02h00

    Houve alguma outra época em que a seleção brasileira dependeu tanto de apenas um jogador? Procuremos.

    É sabido que o folclore futebolístico nacional atribui as conquistas das Copas do Mundo de 1962, no Chile, e a de 1994, nos Estados Unidos, à genialidade de Mané Garrincha e do Baixinho Romário.

    O que se diz é que os dois as ganharam sozinhos.

    Provavelmente há algum exagero nisso, mas não há em dizer que a má atuação de Neymar contra a Colômbia decretou a primeira derrota do time de Dunga.

    Em 1962, a seleção brasileira conseguiu o bicampeonato seguido mesmo sem Pelé, que se machucou no segundo jogo e não voltou mais.

    Garrincha, então, surpreendeu o mundo e jogou pelos dois.

    Fez gols de cabeça, de esquerda, de fora da área, quatro ao todo, e sem ele teria sido impossível levantar o caneco pela segunda vez.

    Mas Mané não era uma ave solitária a fazer verão. Longe disso, tenha a companhia de gênios como Djalma Santos, Nilton Santos e, sobretudo, mesmo já veterano, de Didi, assim como de Zito, Gylmar, Mauro, enfim, de um timaço.

    Em 1994 não foi muito diferente.

    Difícil imaginar o tetra sem Romário, a começar pela classificação que garantiu contra o Uruguai num jogo épico no Maracanã lotado por mais de 101 mil pagantes. O Baixinho marcou os dois gols da vitória por 2 a 0, no segundo tempo, o que lhe garantiu um lugar na janela do avião que levou a seleção para os Estados Unidos.

    Lá, Romário quase não treinou, mas pintou e bordou o suficiente para levar o time à quarta estrela, com cinco gols além de passes decisivos para Bebeto.

    Sim, para Bebeto.

    Romário também não era um náufrago em ilha deserta. Além do companheiro de ataque, tinha Taffarel no gol, a dupla de zagueiros Aldair e Márcio Santos praticamente perfeita durante toda a Copa, uma única falha num gol holandês na dura vitória brasileira por 3 a 2, e tinha Dunga, que fez uma Copa excepcional.

    Sem Romário, como sem Garrincha, a taça não viria, mas eles tiveram coadjuvantes com qualidades de atores principais.

    As conquistas de 1958, com Didi, Mané e Pelé; a de 1970, com Pelé, Tostão, Gérson e Rivellino, e a de 2002, com Rivaldo e os Ronaldos, não comportam nenhuma discussão em torno de apenas um craque, tantos havia nos três esquadrões, muitos deles nem citados aqui, por redundante.

    Completamente diferente é a situação atual.

    Não há nenhum perna de pau na seleção de Dunga, mas não há, também, ninguém que se aproxime da excelência de Neymar.

    Até houve uma regressão neste aspecto, porque cinco anos atrás flertávamos com a possibilidade de Neymar ter as companhias de Paulo Henrique Ganso, Kaká, Robinho, algo que o tempo tratou de mostrar que era apenas ilusão.

    Hoje o que resta ao torcedor brasileiro, em sua relação de amor e ódio com o time da CBF, é torcer para que os 10 que jogam com Neymar, sejam eles quais forem, não o atrapalhem, o protejam, o entendam e percebam que se ele ainda não é Garrincha, nem Romário, quando joga mal o time todo sofre. E a Colômbia ganha.

    juca kfouri

    Tem mais de 40 anos de profissão. É formado em ciências sociais pela USP. Escreve às segundas, quintas e domingos.

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