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    Julia Sweig

    1 + 2 = 3

    25/02/2015 02h00

    Depois de anos –não, décadas– de um perfil diplomático discreto nas Américas, os EUA reaparecem em cena, num movimento que pode, quem sabe, render os frutos de uma estratégia séria.

    Primeiro passo: a monumental reviravolta de Obama com relação a Cuba. Segundo passo (menos monumental, mas muito importante): a nomeação de Bernie Aronson como enviado especial para o processo de paz colombiano.

    Democrata, Aronson foi secretário-assistente de Estado para a América Latina sob George Bush pai. Sua maior realização foi ter compreendido que o processo de paz salvadorenho não poderia ter êxito se os EUA insistissem em comandá-lo. Pedir à ONU, à OEA e a outros atores que assumissem a liderança foi um passo importantíssimo. A iniciativa revelou o julgamento –incomum na época, especialmente no hemisfério ocidental– de que o poder e a hegemonia americanos deveriam ser administrados com cautela. Uma meia verdade.

    O sucesso em El Salvador prenunciou o reconhecimento de que, no atual processo de paz da Colômbia, o sujeito com as armas poderosas que respalda o Estado não pode também ser visto como mediador neutro, especialmente a partir do momento em que a iniciativa do processo de paz foi tomada pelo próprio Estado colombiano. Entre os muitos componentes dos avanços feitos até agora está o fato de que Havana –inicialmente em segredo e, nos últimos dois anos, publicamente– vem sediando as negociações, operando com o apoio explícito da região inteira, incluindo os EUA.

    Os poderes confiados a Aronson são propositalmente um pouco vagos, mas sua indicação assinala que todas as partes em volta da mesa estão preparadas para ver (e os detratores precisam ver) os EUA posicionados para persuadir, incentivar e fazer pressão por acordos sobre as questões mais difíceis que ainda estão por decidir.

    As etapas finais serão fascinantes, mas a crise cada vez mais aguda na Venezuela não pode ser ignorada. Não há muitas evidências de que a Unasul, a OEA, a ONU, a UE ou os próprios venezuelanos tenham encontrado um caminho eficaz para sair dos ciclos de polarização, violência e ruína econômica.

    Então é aqui que um mais dois realmente é igual a três. Os EUA e Cuba passarão ao menos os próximos dois anos envolvidos numa negociação prolongada sobre uma série de questões bilaterais.

    Tirando o Brasil, e especificamente Lula, Cuba é o único país com a influência necessária para potencialmente fazer diferença com Caracas. Washington não está em posição de fazer exigências de Havana. Mas a paz social na Venezuela interessa às duas capitais, embora de perspectivas muito diferentes.

    Durante a violência do ano passado na Venezuela, sugeri aqui que John Kerry ligasse para o chanceler cubano, Bruno Rodríguez. A sugestão talvez tenha sido prematura. Mas não é mais.

    Terceiro passo: uma conversa sobre a Venezuela entre indicados de John Kerry (Bernie), Bruno Rodríguez (Fidel) e Mauro Vieira (Lula). Soa improvável? Faça as contas.

    julia sweig

    Escreveu até maio de 2015

    É pesquisadora-sênior na Lyndon B. Johnson School of Public Affairs, da Universidade do Texas, em Austin (EUA).

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