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    Kenneth Maxwell

    Crimeia

    06/03/2014 03h30

    A Crimeia já viu conflitos internacionais no passado. A Guerra da Crimeia, de 1853 a 1856, foi um desastre para todas as partes envolvidas, tendo causado mais de 300 mil mortes –80 mil em combate, 40 mil por ferimentos e mais de 100 mil por doença. O Exército britânico, por exemplo, perdeu 2.755 homens em ação, 2.019 por ferimentos e mais de 16 mil por doença.

    A Guerra da Crimeia envolveu uma aliança entre o Império Otomano, a Grã-Bretanha, a França e a Sardenha contra uma Rússia expansionista. Resultou de erros fatais de líderes ineptos, que também respondiam a uma opinião pública ativa, alimentada por notícias rapidamente distribuídas pelos novos cabos telegráficos, instalados inicialmente no mar Negro por franceses, em 1854, e, em seguida, por britânicos, em 1855. Depois disso, as notícias chegavam a Londres em um dia. A Guerra da Crimeia foi o primeiro conflito a ser registrado pela fotografia, então uma nova invenção. Mas o conflito foi mais notável pelos múltiplos erros logísticos, táticos e médicos de todos os envolvidos.

    A Rússia desejava um porto de águas quentes no mar Negro e avançavam rumo ao sul, sobre território governado havia muito pelos turcos otomanos. Os russos alegavam defender os cristãos ortodoxos contra o domínio muçulmano; a França reivindicava o direito de proteger os católicos da região. Isso, porém, eram desculpas para camuflar objetivos geoestratégicos e financeiros conflitantes no mar Negro e no leste do Mediterrâneo.

    A Rússia perdeu no médio prazo, e também os otomanos. O conflito produziu momentos memoráveis. Os russos resistiram por mais de um ano na fortaleza de Sebastopol. A batalha de Balaclava entrou para a história pelo desastroso avanço da brigada leve da cavalaria britânica contra os canhões russos, celebrada em famoso poema de lorde Tennyson.

    As consequências da guerra foram múltiplas. No Báltico, Immanuel Nobel, pai de Alfred, o criador do Prêmio Nobel, ajudou a Rússia ao adaptar explosivos industriais, nitroglicerina e pólvora para o uso em minas navais. Nos campos de batalha da Crimeia, Florence Nightingale e a enfermeira jamaicana Mary Seacole revolucionaram o tratamento de soldados feridos.

    A Rússia terminou por se expandir e incorporar a península da Crimeia, estabelecendo sua frota no mar Negro. Em 1954, o líder soviético Nikita Khruschov decidiu que a Crimeia seria parte da Ucrânia, claramente não prevendo a cisão da União Soviética.

    Mas duvido de que o presidente Putin e o presidente Obama saibam muito sobre tudo isso, enquanto tropeçam rumo a uma nova batalha de vontades sobre um território onde ecoam precedentes muito antigos e muito infelizes.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    kenneth maxwell

    Escreveu até julho de 2015

    É historiador britânico graduado em Cambridge (Reino Unido) com doutorado em Princeton (EUA). É referência na historiografia sobre o período colonial brasileiro.

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