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    Kenneth Maxwell

    A vingança de Thatcher

    18/09/2014 02h00

    A Escócia vota hoje um referendo sobre sua independência. As pesquisas mostram que é impossível prever o resultado. Partidários do "não" têm ligeira vantagem. Entre 6% e 10% dos eleitores se declaram indecisos, e cerca de 90% do eleitorado de 4,29 milhões de votantes deve comparecer. Muita coisa está em jogo. Um terço da massa territorial do Reino Unido pode deixar de ser território britânico. Criada há 307 anos, a união entre Escócia e Inglaterra pode terminar.

    Os políticos estão em pânico em Londres. O primeiro-ministro britânico David Cameron, falando em Aberdeen (Escócia), fez um apelo desesperado: "Não dividam a família... se a Escócia votar sim, o Reino Unido se dividirá e nos separaremos para sempre".

    Sua tardia intervenção destaca o quanto o sistema político de Londres está distante das bases políticas e o sucesso com que Alex Salmond, o primeiro-ministro escocês, capturou a insatisfação popular na Escócia e no Parlamento britânico.

    Uma Escócia independente certamente é viável. O país teria 90% das receitas britânicas com o petróleo do Mar do Norte. O debate sobre a independência se concentrou na moeda (uso da libra esterlina), nas projeções sobre a produção de petróleo e gás, no sistema de saúde e educação, e na política de defesa.

    O antigo chairman do Fed (banco central dos EUA) Alan Greenspan definiu as projeções sobre o petróleo como "implausíveis" e uma união monetária como "inconcebível". Robert Zoellick, ex-presidente do Banco Mundial, e George Soros também apoiam o voto no não. Artur Mas, primeiro-ministro da Catalunha, para surpresa de ninguém, apoia o voto no sim.

    Por que o apoio à união definhou? O fim do império, depois da Segunda Guerra Mundial, contribuiu. Os escoceses encontravam muitas oportunidades nas antigas colônias e nas forças armadas britânicas. Mas grande parte da responsabilidade cabe a Margaret Thatcher, e aos acontecimentos dos anos 80. Os setores carvoeiro e de naval escoceses sofreram declínio terminal. Tais transformações eram inevitáveis, mas Thatcher as encorajou.

    O Partido Conservador agora tem só um representante escocês em Westminster. Os trabalhistas detêm 44 dos 59 assentos escoceses no Parlamento. A independência tornaria implausível um futuro governo trabalhista. Ed Miliband, o líder do Partido Trabalhista, está em pânico e, em companhia de Cameron e de Nick Clegg, líder do Partido Liberal Democrático, assinou um compromisso para conferir mais poderes ao Parlamento escocês em caso de vitória do não, promessa que causou reação negativa dos conservadores ingleses.

    Se o Reino Unido acabar, os políticos de Londres (com ajuda de Margaret Thatcher) não poderão culpar a ninguém mais senão eles mesmos.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    kenneth maxwell

    Escreveu até julho de 2015

    É historiador britânico graduado em Cambridge (Reino Unido) com doutorado em Princeton (EUA). É referência na historiografia sobre o período colonial brasileiro.

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