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    Kenneth Maxwell

    Turismo e terror

    02/07/2015 02h00

    Na sexta-feira (26), perto de Sousse, um balneário na Tunísia, a sanha homicida de Seiffedine Rezgui foi desencadeada na praia e em torno do Riu Imperial Marhaba Hotel. Trinta e oito pessoas perderam a vida. Rezgui tinha como alvo turistas, foi morto a tiros e o Estado Islâmico (EI) reivindicou responsabilidade por suas ações.

    O primeiro-ministro britânico David Cameron declarou que a batalha contra "os extremistas islâmicos é a luta de nossa geração". Acrescentou que os extremistas representam "ameaça à nossa existência". As mortes na Tunísia vieram ao mesmo tempo em que um atentado suicida matou 27 fiéis em uma mesquita xiita do Kuait e que um homem foi decapitado na França por outro extremista islâmico. Acredita-se que mais ataques sejam inevitáveis. É difícil antecipar onde acontecerão e ainda mais difícil impedi-los.

    Mas o que dezenas de milhares de turistas europeus estavam fazendo nas praias da Tunísia? Afinal, foi só em 2011 que o então presidente, Ben Ali, decidiu fugir do país depois de 23 anos no governo, o que marcou o início da Primavera Árabe. Ainda que a Tunísia seja um dos poucos países da região onde há pelo menos uma aparência de democracia, é também o país que mais enviou combatentes para lutar nas fileiras do EI na Síria e no Iraque. Há poucos meses, estrangeiros foram mortos em um ataque terrorista ao Museu Nacional de Túnis.

    Europeus continuam a chegar ao país por meio de pacotes de férias organizados por companhias de viagens como a britânica Thomas Cook e o Tui Group, da Alemanha, dono do Riu Imperial Marhaba, um hotel de cinco estrelas. A Thomas Cook estima que a Primavera Árabe tenha reduzido seu lucro em 80 milhões de libras em 2011 e, o Tui Group, em 84 milhões de libras. Na Tunísia, 400 mil pessoas trabalham no setor turístico e um milhão de tunisianos dependem dele. O turismo responde por 14% do PIB do país.

    A Líbia fica logo ao leste da Tunísia. Foi lá que o EI fincou raízes e onde Rezgui recebeu seu treinamento. É também na Líbia que milhares de africanos e árabes desesperados esperam para fugir através do Mediterrâneo em embarcações precárias, rumo à Europa. Cameron deixou claro que esses emigrantes não serão admitidos no Reino Unido.

    É hora de reavaliar os papéis que o lucro, a segurança e a ameaça real do terrorismo desempenham nesses eventos. É o mínimo que devemos àqueles que inocentemente (e talvez ingenuamente) desejavam apenas escapar em "pacotes de férias" para se divertirem na praia, e presumiam (erroneamente) que a Tunísia fosse o lugar certo. E também pode ser hora de reavaliar o que será necessário, para além de declarações rancorosas, a fim de enfrentar a ameaça que o EI hoje representa.


    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    kenneth maxwell

    Escreveu até julho de 2015

    É historiador britânico graduado em Cambridge (Reino Unido) com doutorado em Princeton (EUA). É referência na historiografia sobre o período colonial brasileiro.

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