• Colunistas

    Tuesday, 30-Apr-2024 16:18:43 -03
    Laura Carvalho

    Governo terá de encarar a realidade após aprovação da PEC do Teto

    01/12/2016 02h00

    Alan Marques/Folhapress
    BRASÍLIA, DF, 27.11.2016: TEMER-DF - Coletiva de imprensa com o Presidente da República Michel Temer, Presidente do Senado Renan Calheiros e o Presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia, com jornalistas, na tarde deste domingo, no Palácio do Planalto. (Foto: Alan Marques/Folhapress) PODER
    Michel Temer, Renan Calheiros e Rodrigo Maia em coletiva no Palácio do Planalto

    O Senado aprovou na terça-feira (29), em primeiro turno, a PEC 55, que tem sido vendida desde o início do governo Temer como uma verdadeira panaceia para os graves problemas enfrentados pela economia brasileira. Com a provável aprovação da proposta em segundo turno no próximo dia 12, o governo terá de encarar a realidade.

    Se a retomada do crescimento econômico, a criação de postos de trabalho e o reequilíbrio das contas públicas dependessem apenas de uma base de 3/5 dos senadores e de uma alteração retrógrada na Constituição, o governo Temer estaria salvo. O que os números mostram, no entanto, é que a macroeconomia existe.

    O desemprego em alta, o alto grau de endividamento de empresas e famílias, o aumento da capacidade ociosa da indústria e as sucessivas frustrações de arrecadação das várias esferas de governo são apenas alguns dos elementos que vêm transformando a economia brasileira em um deserto. Sem perspectiva de retomada do consumo, das exportações e da capacidade de investimento do Estado, o investimento privado não tem razões concretas para reagir. Diante de tal cenário e de uma recessão que já chega a 10% do PIB, o governo Temer, se sobreviver até lá, terá alguns caminhos possíveis.

    O primeiro é tentar suprir a síndrome de abstinência deixada pela PEC 55 com a reforma da Previdência, iniciando mais uma rodada de negociações difíceis com a base parlamentar. Assim como a PEC, a reforma não tem efeitos imediatos e não ajudará a resolver a situação fiscal de curto prazo ou a crise econômica no país. Mas, ao contrário da PEC, que disfarçou seus impactos futuros sobre direitos conquistados sob o véu da responsabilidade fiscal, a Previdência é assunto que a maior parte dos brasileiros entende.

    A tolerância da população, que, após os sucessivos escândalos de corrupção envolvendo membros do alto escalão do governo e as manobras do sistema político para salvar-se da Operação Lava Jato, já está próxima de zero, não deve facilitar em nada a vida do governo.

    A alternativa seria descontentar sua base "patista" de apoio e propor a elevação de impostos para resolver o problema fiscal de curto prazo. O fim das desonerações fiscais concedidas ao longo do primeiro governo Dilma e o fim da isenção de IRPF sobre dividendos, que já dura mais de 20 anos, seriam suficientes para reduzir o deficit fiscal pela metade no ano de 2017.

    O problema é que um reequilíbrio das contas públicas não serviria mais ao propósito de ampliar a capacidade de investimento do Estado –o único capaz de agir em meio à crise para puxar uma retomada. Mesmo em caso de aumento de receitas, a PEC 55 inviabiliza, na prática, uma expansão dos investimentos.

    Se o governo conseguir, em meio a tanta incerteza, atrair investidores para as concessões do Plano de Parcerias de Investimentos (PPI), os efeitos concretos sobre o investimento só viriam após 2018, na melhor das hipóteses. De mais imediato, sobra apenas a renovação das concessões de ferrovias e rodovias com contrapartida em investimentos, se os órgãos de controle permitirem.

    Após dois anos de frustrações nas projeções, a ficha parece estar caindo até mesmo entre os analistas mais ingênuos. Na era da pós-verdade, a economia ainda é movida por fatos.

    laura carvalho

    Laura Carvalho é professora do Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for Social Research (NYC). Escreve às quintas-feiras.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024