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    Laura Carvalho

    Economia brasileira leva de 7 a 1

    09/03/2017 02h00

    J.Duran Machfee/Folhapress
    Trabalhadores enfrentam longa fila de emprego no Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo, nesta terça-feira
    Trabalhadores enfrentam fila de emprego no Vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo

    Os números de 2016 recém-divulgados pelo IBGE confirmaram o colapso vivido pela economia brasileira desde o início da maior crise econômica da qual já tivemos notícia —ou estatística.

    Desde 2014, a queda acumulada do PIB já chega a 7,2% em níveis absolutos e a 9,1% em termos per capita.

    O ritmo de contração da economia, que diminuiu entre o segundo trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2016, parece ter acelerado desde o fim do processo de impeachment de Dilma Rousseff.

    Ao contrário do prometido, a troca de liderança não foi suficiente para o retorno à estabilidade e a retomada dos investimentos.

    Entre os mais otimistas, restaram apenas os que defendem que a aprovação da PEC do "teto de gastos" e da reforma da Previdência se encarregará de colocar o país novamente na rota do crescimento robusto, pois abriria espaço para a redução dos juros e a volta da confiança.

    Entre os mais pessimistas, estão os que, como eu, acreditam que, em um contexto de capacidade ociosa da indústria, desemprego elevado e alto endividamento privado, as contrações sucessivas nos investimentos públicos continuarão impedindo uma retomada substantiva dos investimentos privados e do consumo das famílias nos próximos anos.

    Dado o baixo patamar em que a economia se encontra, as medidas anunciadas pelo governo até aqui podem, no máximo, substituir recessão por estagnação.

    As previsões distintas sobre o futuro refletem diagnósticos também distintos sobre as causas da crise.

    Enquanto, para muitos analistas, a crise é explicada pela gastança desenfreada, para alguns de nós, a deterioração nas contas públicas desde o primeiro mandato de Dilma Rousseff é sobretudo fruto de uma queda na arrecadação —pelas custosas desonerações concedidas e pelo baixo crescimento. Na segunda hipótese, o corte de gastos e investimentos públicos implementado desde 2015 lançou gasolina ao fogo.

    Como mostrou Vinicius Torres Freire em coluna nesta Folha, quase não há registro histórico de uma crise dessa magnitude em um país com tamanho, instituições e renda per capita minimamente comparáveis aos nossos. Sobretudo fora de um contexto de crise financeira.

    Em 2015, a Rússia foi o único outro país entre os 46 que constam da base de dados da OCDE a passar por uma recessão.

    Ainda assim, mesmo sofrendo sanções econômicas de Estados Unidos, União Europeia, Japão e Canadá pelo conflito na Ucrânia, a queda acumulada foi de cerca de 4% no biênio 2015-2016 e parece já ter chegado ao fim.

    No Brasil, nem a crise da dívida da década de 1980 nem o confisco da poupança em meio à hiperinflação tiveram efeitos recessivos tão profundos ou duradouros. A economia mexicana caiu menos de 4% quando declarou a moratória da dívida em 1982. Atribuir todo o colapso atual a uma irresponsabilidade com as contas públicas ou ao descontrole de preços parece pouco plausível.

    Mas o ajuste fiscal tampouco explica o tamanho do buraco em que nos metemos. As repercussões da Operação Lava Jato, as aberrações do nosso sistema político e o troca-troca de ministros pelos piores motivos, por exemplo, têm de ser levados em conta.

    O governo Temer não parece mesmo ter vindo para assegurar a estabilidade política, superar o caos institucional ou colocar o "país nos trilhos".

    laura carvalho

    Laura Carvalho é professora do Departamento de Economia da FEA-USP com doutorado na New School for Social Research (NYC). Escreve às quintas-feiras.

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